31 Jan
31Jan

Na mala, nunca fala o carregador de celular, um bom livro pra ler, as vezes até o computador. Costuma faltar uma camisa a mais, um par de chinelos, ou até a escova de dentes, mas, algo que conseguimos substituir rapidamente na primeira mercearia que encontramos. Mas quando vamos visitar um amigo, parece que na bagagem vai mais coisas do que esperávamos que fosse: vai muita saudade, aquelas lembranças de quando morávamos na mesma cidade... e ficamos contando os dias para se reencontrar. 

Quando esta visita chega primeiro, ela chega no meio da “arrumação”. A casa está “revirada”, como diziam meus avós: tudo fora do lugar, vassoura para um lado e os sofás pro outro. Os cumprimentos são misturados aos pedidos de desculpas pela bagunça e também pelo desejo da visita “ficar À vontade” no cantinho que conseguir. O abraço está misturado a perguntas como, “você está com fome?”; “do que você precisa agora?”, e o abraço continua, mesmo com a casa para arrumar. Mas a visita chegou! 

De repente, tudo vira uma coisa só. Parece todos de casa, da mesma casa, da mesma família, e recomeçam a limpeza da casa, varre pra cá, soltamos gargalhadas de lá, e, num passe de mágica sai uma garrafa de café fresquinho. Parece que é tudo da mesma casa e até mesmo aquela que era visita está, ou limpando a casa, lavando pratos ou picando algum ingrediente para o almoço. 

A magia de tudo isso é que, não costuma haver tempos para um registro pelo celular. Ali mesmo a conversa rende. Todos perguntam sobre todos. O que fazem, onde moram, qual sua profissão, o que faz da vida e, no mínimo, já se enturma e começa a fazer coisas próprias da casa que, no início lhe era estranha. A visita deixa de ser visita, torna-se amiga, conhecida, “pessoa bacana”, boa de papo, que brinca, se diverte, conta piada e até gera alguma discussão. 

Fotos? Selfies? Nem lembramos. Não fez falta. Nem foi preciso verificar se na mala havia o carregador. O livro? Nem sei se houve tempo para ele. A saudade era mais importante; colocar os papos em dia. Ouvir novas histórias. Algumas tristes, de superação, outras bem divertidas, de altas risadas, prósperas e coisas sobre a vida passada. Aí chega os outros. As demais visitas. Aquelas que aparecem no mesmo dia que vão embora. Passam por uns poucos minutos, ou horas. Flashes para todo lado. Fotos boomerang. Vídeos para reels. Fotos daqui, dali, selfies, é preciso registrar porque não temos muito tempo. 

A casa do outro parece virar ponto turístico; lugar de evento ou local de visitação. Tudo parece ter a plaquinha “não mexa”, ou “proibido se aproximar”. Alguns nem se aproximam, abraçam, não sentam e nem proseiam. Amigos turistas não são um erro, mas também não são satisfatórios, continuam sendo amigos, porém, mais rasos. Vivem em busca de uma lembrança ou de algo que possa postar, mostrar para os outros, para seus seguidores. Uma lembrança pra levar pra outra cidade e relembrar nos TBTs das Redes. Vieram, pouco prosearam, pouco aproveitaram. Não tiveram tempo de ouvir histórias. Muito registraram e foram embora. Visitas! 

Mas a última a sair, sai querendo ficar, ou sai já com aquele desejo de voltar. Porque foi bom, foi simples, bagunçado, tumultuado, mas bom. Se no começo encontrou a casa sendo arrumada. No fim não foi diferente, pois a casa volta a ser arrumada novamente depois que as visitas de um dia passaram, como um furacão. Dizem que “visita boa é essa que chega primeiro e sai por último”, porque essa, vendo tudo, não se importa com a rotina dos amigos que foi visitar. Vê que, a casa se esforça para acolher bem, vê que antes da cama bem arrumada, sala aconchegante, casa arejada e limpa, tudo teve que ser limpo, arrumado, faxinado. Viu tudo isso e se envolveu... Não fez vista grossa, mas se sentiu tão em casa como se estivesse na sua própria.





Por Dione Afonso | Jornalista

31.janeiro.2023

Foto: Gustavo Fring via Pexels.

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