29 Mar
29Mar

01 de janeiro de 2021. Janeiro. Primeiro do ano. 2021. Presenciamos mais uma virada de década. Minha tia começa a contar uma história que se inicia com uma oração gramatical peculiar: minha comida está triste. Não é algo comum de se ouvir. Também não é algo que nos enche de sentido à primeira audição. De um dos lados do alpendre encontra-se sobre azulejos cor de cinza o fogão à lenha. O lugar que aquela mulher mais gosta de sua casa. Aliás, geralmente as mais belas histórias da vida foram contadas à beira do fogão à lenha, mais até que na cabeceira de uma cama. 

É à beira do fogão à lenha que ela passa a maior parte do seu tempo. Desse encontro nascem as mais declarações de aromas e sabores, principalmente quando o amor, o carinho e a alegria se tornam os principais ingredientes dessa serenata. Mas, não é todo dia que a lenha se acende com facilidade. Tem dias que nossos esforços tendem a ser maiores. A lenha fria precisa de um pouco mais de estímulo para se aquecer, tornar-se viva novamente, nem que seja pela última vez. E, assim, ela se torna chama viva, brasa, e, por fim, cinza. Enquanto cinza, renascem o almoço mais saboroso que experimentamos. 

Num breve momento de reflexão, durante o almoço de domingo, olhando sobre a mesa com a refeição posta, e outras panelas sobre o fogão à lenha para manter-se aquecidas, percebi, nessa fração de segundo, o momento vigente. O momento pós-pandemia (que ainda não chegou, mas que almejamos diariamente), não poderá se ancorar sobre colunas recheadas com aquilo que perdemos e aqueles que foram tirados de nós. Mas, quando esse momento chegar, que possamos nos firmar sobretudo naquilo e naqueles que nada têm e que não são lembrados em nenhum momento da vida. Presentes natalinos e de outras comemorações vêm e vão. Passam de mão em mão para parentes, amigos e o grande amor da sua vida. Enquanto isso, aqueles que desejariam ser presenteados pelo simples gesto de serem vistos e lembrados, continuam ali, esquecidos num cantinho da cidade e da própria vida, porque ninguém, nem ao menos sabe que existem. 

Você, passa todos os anos se preocupando em rechear de caixas de presentes debaixo de um pinheiro enfeitado, enquanto muitos, uma grande parcela humana, inclusive, só gostaria de ter uma árvore dessa para se abrigar debaixo. Para 2021 parece que o presente está meio diferente, você não acha? 

É fácil presentear aqueles que todo ano estão com a gente, porque isso é de praxe, é comum, normal. Mas, não é esse normal que acabou tirando de nós parentes, amigos, quem amamos...? Não é esse normal que a pandemia fez questão de mostrar que está errado e que precisamos consertar? Pois bem, aquele almoço de domingo, com a família reunida, natalício sendo celebrado, fogão à lenha do lado e ativo, num breve segundo do sonhador, percebi o quanto aquela comida realmente estava triste. Faltou amor, porque faltou esperança, porque não havia muitos motivos para sorrir, porque a covid-19 decidiu esvaziar algumas cadeiras... 

Que 2021 não seja diferente como muitos querem e nem seja igual como muitos temem. A covid-19 pode sim ter esvaziado algumas cadeiras, mas, e aquelas que não são preenchidas já há alguns anos? Vamos colocar isso no débito da pandemia também? Que 2021 seja apenas 2021. 2021 com um olhar diferente para o humano, para o humano que há em mim e o humano que há no outro. Precisamos nos humanizar mais para imunizar melhor. Humanizar as relações afim de imunizar os órgãos vitais da vida humana. Que 2021 apenas seja... 

Não haverá fogos de artifício à beira da praia, talvez esse seja mais um sinal da pandemia nos indicando que a luz que deve brilhar é a de cada um de nós, sem alarde, sem artifícios, mas sincero e generoso. Seja você! 

Que brilhe a sua luz! 

Bom 2021 a todos!



Por Dione Afonso, SDN | PUC Minas

Foto: Casinha simples. Imagem de @LucasFZ70 via Pixabay. 

01 de janeiro de 2021. 

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