30 Sep
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“As mulheres negras conquistando espaços e movendo as estruturas! A 48ª edição do Festival de Cinema de Gramado, que se encerrou no último sábado (26), teve um marco histórico para o cinema: Mulheres negras ganharam todos os prêmios femininos de atuação da competição nacional de longas.”. 

[Matéria por Mídia Ninja / @midianinja].

 

 

 

Quem aqui não se lembra das estranhas e tristes pulseiras coloridas que serviam para cobrir umas ataduras no pulso? (Cena de As Virgens Suicidas, 1999). Ou então, daqueles tons pastéis e sem muito estilo, um cenário frio e sentimental? (Encontros e Desencontros, 2003). Ou ainda aquela trilha sonora que dava o toque final de maestria para que a cena acontecesse? (Um Lugar Qualquer, 2010).

A filmografia de Coppola é peculiar. Seus filmes muito próximos àquele movimento do cinema francês que veio para desbancar o glamour de Hollywood, sempre despertaram um certo interesse no público. Nem que seja pelo desconforto, já que Sofia não gravava por gravar. Suas histórias sempre eram carregadas de detalhes. Detalhes esses que se não estivessem no lugar certo e na hora certa, perdia-se todo o sentido do enredo.

Sofia Carmina Coppola nasceu em 14 de maio de 1971 em Nova York. Seu sobrenome já carrega a fama dos Coppola. Em seu seio familiar já existia a veia da sétima arte e era só questão de anos até que a pequena jovem se desbravasse pelos estúdios construindo seu próprio caminho. Distanciando-se completamente do estilo do pai o cineasta Francis Ford Coppola, Sofia desenvolve um estilo fílmico marcado pela sensibilidade, dramas sentimentais, dilemas sociais e se debruça em histórias de vida marcadas pela solidão com uma leve pitada de aventura.


Temas existenciais e a busca por identidade dos personagens

Não obstante, é impossível nos deparar com uma obra de Sofia sem que nela não exista personagens confusos, perdidos, sem rumo, sem em busca de uma afirmação existencial e procura da própria identidade. Sofia Coppola parece usar essa ferramenta como fio condutor de suas obras. É a espinha dorsal que dá movimento. A dor movimenta. A solidão provoca a ação. O desejo de busca, reação.

A iminência de um final trágico sempre nos coloca aquela tensão. Nem sempre acontece, mas se você não fica tenso em assistir um filme, por mais divertido que a história seja, essa não é uma obra de Sofia Coppola. Quando estreou no cinema em 99 com As Virgens Suicidas, por exemplo, nunca umas pulseiras nos amedrontassem tanto. Ambientado nos anos 70 e numa cultura tradicional e conservadora, a diretora usa de tons pasteis para, de certa forma, nos incomodar. O filme nos encharca de porquês nunca respondidos.

Balanceando o dilema entre a beleza e o sofrimento da juventude, Sofia embala o enredo apresentando uma trilha sonora que dá conta de nos fazer não desistir da trama e sofrer no final.

Temas como o suicídio, o bullying, a solidão (neste filme é fortemente marcado pelo ambiente melancólico), os relacionamentos abusivos, a angústia aguda, e a degradação da imagem feminina são cargos chefes de Sofia Coppola.


Um estilo peculiar que nos atormenta

Em 2003 Encontros e Desencontros trouxe uma obra em que o personagem dançada com as cores das cenas. Elas acompanham-na a cada detalhe e desenvolvimento, sobretudo emocional. Nunca um diretor conseguiu antes casar tão bem essas duas coisas com perfeito movimento. Protagonizado por Scarlett Johansson, o longa abandona os temas carregados da existência humana, mas não abre mão da jornada de busca de identidade.

O choque de gerações ganha um primeiro plano na trama, mas nos faz olhar mais para a amizade e sutileza do que para o problema em si. Por que que um encontro casual e imprevisto não pode mudar uma história? Do imprevisto, Sofia faz um enredo torna-se uma jornada inesquecível. Um simples encontro, nada programado, muda completamente a rotina de alguém.

O estilo peculiar da cineasta as vezes nos atormenta. A diretora deixa-nos entender que quase nada é programada, é como que “fazer cinema” fosse uma obra do acaso e que simplesmente pegar a câmera e filmar fosse um ato comum sem nada pré-organizado. Bom! Claro que ela não faz isso. Mas, talvez cinema seja isso, um contar simples e comum de nossa história. Simplesmente com o que estamos fazendo e do nada, fira uma bela história sobre sentimentos e devaneios nossos.


A mulher do Oscar

Sofia Coppola é a 3ª mulher na história a ser indicada ao Oscar de melhor direção, sendo também a primeira americana a conseguir esta indicação. O filme de 2003 a concedeu o prêmio de Melhor Roteiro Original no Oscar de 2004. No Festival de Cannes ela recebeu a Palma de Ouro pela Direção de O Estranho Que Nós Amamos de 2017.

Quando ela apresenta uma obra “não-canônica” de Maria Antonieta (2006), a cineasta não foi muito bem compreendida. No entanto, sua versão apresenta uma não-biografia que focaliza mais a sensação de solidão e de abandono e as incompreensões sociais em que a personagem e o poder feminino não são vistos como pertencentes da sociedade atual. Ou seja, de uma versão original e verdadeira, Sofia decide apresentar ao público uma luta pelo reconhecimento feminino. De mulheres ter vez, voz e lugar de fala e de ação político-social. Incompreendida? Talvez, mas, acredito que foi mais uma questão de despreparo pelo público. Não estavam prontos! Mas sua obra veio no momento certo. Já era hora de alguém pôr “a boca no trombone”.

O longa de 2006 deu a Sofia Coppola o Oscar de Melhor Figurino e fez do longa uma referência para a moda.


De volta ao Festival de Cinema com On The Rocks

On The Rocks é uma dramédia norte-americana dirigida e escrita por Sofia Coppola. Depois de 17 anos, desde Encontros e Desencontros, Sofia reencontra também com Bill Murray. Mais uma vez Coppola mergulha na jornada por autoconhecimento em que o personagem está em constante busca por se conhecer.

 O longa teve sua estreia no Festival de Nova York e já está ganhando vários elogios da crítica especializada e do público – que estão caracterizando o longa como a produção mais leve da diretora e a sua melhor entrada desde Encontros e Desencontros (2003). A história se passa em Nova York e acompanha Laura (Rashida Jones) em sua busca por entender o que está acontecendo no seu casamento: traição do marido, Dean (Marlon Wayans), desinteresse, falta de atração? Nessa trajetória de autoconhecimento, ela encontra no pai, Felix (Bill Murray), uma dupla nada convencional para tentar desvendar essa crise matrimonial.

Enfim, o longa promete nos dar uma boa história dosada de bom humor com um plano de fundo feminista. Ele estará disponível pela Apple TV+ em 23 de outubro. Enquanto ele não chega até nós, que tal relembrar um pouco do estilo cinematográfico da diretora? Segue a lista que mais define sua marca:

  • As Virgens Suicidas (1999)
  • Encontros e Desencontros (2003)
  • Um Lugar Qualquer (2010)
  • O Estranho Que Nós Amamos (2017)


Desde 1927, fundada em Los Angeles, o Oscar é a premiação mais importante com a tarefa de presentear o melhor que existe na indústria cinematográfica. Assim, o cinema reconhece prêmios como excelência e qualidade em suas produções. É apresentado pela The Academy Awards e hoje é o evento midiático mais televisionado do mundo. Enquanto assistimos à premiação dessa edição de 2020, é nítido a discrepante rejeição da presença feminina, sobretudo na indicação de melhor diretor.

A primeira diretora vencedora do Oscar é Kathryn Bigelow, uma cineasta norte-americana que levou a estatueta pra casa por Guerra ao TerrorThe Hurt Locker em 2010. Bigelow disputou o prêmio com nomes como James Cameron por Avatar, e foi a quarta mulher a ser indicada à premiação. Em 1977, Lina Wertmüller com As Sete Belezas de PasqualinoPasqualino Settebellezze foi o primeiro nome a despontar nas indicações, depois em 1994 tivemos Jane Campion com O PianoThe Piano e, em 2004 Sofia Coppola disputou o prêmio com Encontros e DesencontrosLost in Translation.

Até hoje, quando o Oscar começa a se aproximar de seu centenário – a sua 92ª edição ocorrida neste ano –, apenas uma mulher foi premiada por seu trabalho cinematográfico. Poucas são indicadas e lembradas.



“On the Rocks é o melhor filme de Sofia Coppola desde ‘Encontros e Desencontros’. Uma carta de amor irresistível e charmosa para o complicado relacionamento entre um pai e uma filha. Rashida Jones e Bill Murray estão incríveis juntos e fazem uma dupla perfeita. Um dos meus favoritos de 2020”

(Scott Menzel via Twitter @ScottDMenzel)


 

 

Por Dione Afonso

Jornalismo PUC-Minas

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