29 Dec
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Criada, escrita e dirigida pelo sul-coreano Hwang Doung-Hyunk, que, inicialmente não almejava lançar outras temporadas, o segundo ano de Round 6 é surpreendente. Se no primeiro ano os conceitos entre bem e mal ficaram muito evidentes em cada cena de violência, agora, a ambição e a avareza dos jogadores nos assustam ainda mais. A série fez história na edição do Emmy Awards de 2022 ao quebrar barreiras levando 6 prêmios para casa e ainda ter sido indicada à Melhor Série de Drama. Uma produção em língua não-inglesa marcou a história das premiações. Seu criador levou o prêmio de Melhor Diretor e o protagonista Gi-hun, que é interpretado por Lee Jung-jae levou o de Melhor Ator. 

A série segue Gi-hun de volta à ilha com um único objetivo: desmascarar a máfia que está por trás dos jogos. Enquanto que na primeira temporada vimos um foco grande às práticas criminosas de tráfico de órgãos, por exemplo, agora, mesmo esta trama fazendo parte da narrativa, o foco é outro: enquanto Gi-hun, dentro do jogo, tenta desmascarar a cúpula organizadora, do lado de fora, o policial Jun-ho [Wi Ha-joon], que retorna para a segunda temporada, acaba encontrando o rastro de Gi-hun e se vê de volta à investigação que é comandada pelo próprio irmão, o Front Man [Lee Byung-hun]. Novos jogadores, novas críticas sociais, novos desafios e muito mais sangue, revelam que a decisão de retornar com a série foi muito bem acertada. 


Entre a fome e a sorte 

É inegável não nos perturbarmos já logo nas primeiras cenas quando vemos o Recrutador dos jogos [Gong Yoo] roubar a cena numa praça na qual muitos moradores de rua decidem, entre, um pão ou uma raspadinha da sorte. Quando decidem optar pela sorte, ao invés de pegar o alimento, Gong Yoo constrói a narrativa humana da avareza. Não importa o quanto passamos fome, não importa o quanto passamos por dificuldades necessidades da vida, entre a chance de ganhar dinheiro ou a oportunidade de nos saciar, a ambição pelo dinheiro fala mais alto. Round 6 não economiza em esfregar na nossa cara o quanto que a humanidade é gananciosa e que diariamente nós participamos de cenas como esta. 

O jogo macabro, desta vez, deixa ainda mais evidente que os jogadores recrutados não estão muito diferentes que os mendigos que apareceram no primeiro episódio. Perdidos, afundados em dívidas, sem perspectivas de futuro, cada um está ali em busca de se salvar. A salvação, neste caso, não é aquela ancorada no conceito universal. Não. Aqui, o “salve-se quem puder” é individual, Cada um luta pelo o seu. Não importa se eu corro o risco de morrer, mas se tenho uma chance de ganhar mais, eu irei permanecer. Quando os jogadores podem decidir entre votar para parar ou continuar no jogo, a vida deles vale menos que o dinheiro que podem ganhar. 

Entre os jogadores, desta vez encontramos mãe e filho; gestante; artista musical; uma trans que já foi ex-soldado e que foi expulsa do serviço por sua escolha de vida. Mantém-se os personagens cômicos para dar um certo toque de alívio. Um elenco mais jovem que envolve questões sociais mais atuais como a gravidez não planejada, a instabilidade das cripto moedas que levou um dos participantes a se endividar, também influenciadores digitais que não obtiveram sucesso por muito tempo... Artistas musicais... assim como também há alguns idosos que refletem outra parte segregacional da sociedade. 


De volta ao jogo para dar fim a ele 

O roteiro desta vez não se resolverá nesta temporada. Com um belo gancho para a terceira e última temporada o objetivo é, desmantelar todo um sistema corrupto de diversão da nata rica e de outras questões criminosas. Neste ano também descobrimos que os soldados do jogo também possuem suas motivações para irem para a ilha trabalharem para o Front Man. Por isso, desta vez, vemos mais da rotina deles e até a identidade de um deles, a jovem No-eul, interpretada por Park Gyu-young. No-eul teve uma construção narrativa digna de premiação e se sentiu desafiada quando encontrou entre os jogadores um rosto familiar de um pai cujo sua filhinha luta no hospital contra uma leucemia. 

Por mais que a série nos mostra como que a elite rica pode criar ainda mais para perpetuar o sofrimento das classes baixas, Round 6 não erra a mão em estender essas críticas, muitas vezes veladas pelo dinheiro e poder. Sabemos que a sequência da série não foi planejada por seu criador e que ele relutou muito em produzir mais episódios. Ao contrário do que muitos participantes do jogo acreditam ser o correto, Gi-hun, vencedor do jogo dois anos atrás não se conformou em viajar para outro país e construir sua vida de bilionário. Volta atrás e decide pôr fim a um esquema sádico, cruel e desumano. Uma forma suja de eliminar da sociedade quem não produz pra ela. Round 6 é digna de nossa atenção e merece uma reflexão aprofundada sobre o que fazemos com nossas vidas.



Por Dione Afonso   |   Jornalista

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