02 Feb
02Feb

“Uma das maiores mudanças que sofri foi a ausência do acompanhamento virtual: meu foco e dedicação para conseguir estudar teve que ser maior. A questão do cumprimento dos protocolos sanitários muito me preocupa. Eu vou estar dentro de uma sala com muitos outros alunos que não sei quem são e nem se serão responsáveis com as normas ou se irão negligenciá-las colocando em risco a nossa saúde. Concordo que a opção em realizar o ENEM neste ano só aumento ainda mais a discrepância em relação ao Ensino. Nem todos tiveram a oportunidade de uma boa internet e de um acompanhamento justo e de qualidade em suas casas”.     

[Mariana Freitas, 21 anos, Belo Horizonte-MG].   



Mantendo firme seu sonho de ingressar numa faculdade, a estudante Mariana Freitas teve medo e receios em realizar o Exame Nacional do Ensino Médio neste ano. Desde que foi criado, o ENEM representa a oportunidade da realização do sonho de muitos jovens em poder ingressar numa faculdade, ou de realizar o sonho que sempre alimentaram de se profissionalizar na área que gostam. Oportunidades, sonhos, a chance em poder crescer, construir um futuro próspero, são horizontes que um jovem sempre manifestou ter e sempre quis lutar por tudo isso. 

Com a instauração da pandemia em 2020, as normas sanitárias de distanciamento social e não aglomeração desestabilizou todos os eventos que o mundo planejou realizar nos próximos meses. Perto de completar um ano dessa pandemia no Brasil, o calendário instável insistiu em realizar alguns eventos que colocaram em risco muitas vidas: eleições, comemorações de fim de ano, ENEM. 

Com edição adiada para janeiro deste ano, o ENEM não deixou de se classificar como alto risco de contaminação do coronavírus. Alguns estados optaram, à não realização do exame, devido ao alto índice de mortos nas cidades. As que insistiram no exame, houve quase 55% de abstenções. Os próprios inscritos decidiram que seria um erro comparecer no local de prova. 


Ensino remoto frágil e sem planejamento 

A estudante Marilani Braga de Fervedouro-MG, levantou questões a respeito do Ensino remoto, por exemplo, que não esteve presente em todos os lares e que não houve nenhum planejamento, nenhuma proposta de intervenção em atender a todos os alunos. Mesmo acreditando isso ser um trabalho hercúleo, deveria ter tido, pelo menos, uma tentativa, “eu fiz apenas as atividades do ensino remoto (plano de estudo tutorado). No mais, recorri a pesquisas de diversos assuntos e temas como atividades extra curriculares”, afirma. Essa ação gerou um certo desgaste, pois, completa Marilani, “sinto que não me preparei o suficiente, principalmente nas áreas de maior dificuldade. Além disso, a questão da pandemia me deixou muito preocupada”

Muitos sonhos tiveram que ser “cancelados” em nome do cuidado com a saúde e com a precaução. Nosso colaborador, Mínison Domingos, viveu uma experiência numa cidade do interior de Minas Gerais que ilustra tristemente essa realidade. Não do Enem, mas de jovens que, mesmo, tendo todo o ensino nas mãos, perdem-se dopados pela curiosidade. 


Confira: 


Droga é droga, mamãe já dizia... 

Cidade pequena, 

Praça serena, 

Igreja vazia, 

Sobrevivendo à pandemia. 


Em minha ida à matriz, 

Coisa normal, sempre fiz, 

Me deparo com um jovem, 

Dava pra sentir só de olhar, o quanto ele sofre. 


Me pediu um trocado, 

Eu ofereci um papo, 

Ele ficou assustado, 

Mas mesmo sem ele responder, sentei-me do seu lado. 


Entre perguntas e respostas, 

Muitas coisas tomei nota, 

Meu Deus! Quanta tristeza! 

Ver um jovem de 21 anos sem nenhuma certeza. 


Saiu de casa cedo, 

E agora seu maior medo, é não se recuperar. 

Viciou primeiro na bebida, 

Depois do cigarro à cocaína, 

De tudo chegou a experimentar. 


O cara é formado, é letrado, 

Cursou pedagogia, fez mestrado, 

Inteligência de sobra. 

Falando um português de se invejar, 

Eu pude observar, 

Que a maior dúvida é sempre o agora. 


Tem religião, se veste bem, 

Olhos esbugalhados, nariz avermelhado também. 

Inteligência dopada pela curiosidade, 

Aí se perdeu a dignidade, 

Voltar ao começo num tem jeito, 

A vida cobra um alto preço por suas escolhas em nome da liberdade. 


Perguntei por sua família, 

A “mãe chora todo dia”, ele respondeu. 

Já tentou se internar, 

Mas também, tentou se suicidar, 

E já não quer mais em casa ficar. 


Na verdade, ele era de uma cidade vizinha, 

Um pouco maior que a minha 

E ali estava, na Praça da Matriz em minha pequena cidade. 


Ao terminar o papo, perguntei se estava com fome, 

Ele disse sim, ali mesmo num trailer pedi um x-tudo pra ele e paguei antecipado. 

Ele, já emocionado, disse: “moço, obrigado”. 


Apenas disse a ele: “te ouvi e te entendi, o lanche vai tirar sua fome de hoje”. 

Mas, e sua fome espiritual? 

E sua fome emocional? 

Talvez seja melhor dar ouvidos à sua mãe e voltar pra casa, 

Lá você terá só a fome do vício, as outras necessidades serão saciadas. 


Ao dizer isso, vi brilhar no olho dele uma morta esperança,

Estávamos há um metro de distância  

E ele disse: “se não fosse a pandemia, iria lhe abraçar”. 

Disse que nunca havia dito isso 

E, nele eu acredito, 

Pois aquele brilho no olhar eu conheço, é o brilho do sonho.


Foram 15 minutos de conversa e para nós dois, muito aprendizado. 

A moça fazendo o lanche, eu me despedi, 

Terminei de chegar na igreja com a certeza que minha melhor oração havia sido feita, 

Fui visitar o Santíssimo, mas acredito 

Que eu já havia feito isso 

Visitei Jesus no Santíssimo mais belo que existe: 

O coração daquele jovem, feito à Imagem e Semelhança do Criador. 

Uns poucos minutos rezei. 

Saindo, me deparo com ele, lanchando, estava realmente com fome. 

Tentei ser discreto, mas ele me viu e me chamou. 

Disse de novo “obrigado”, 

Que depois iria na igreja rezar e que havia pedido pra moça do trailer para a sua mãe,  ligar 

E iria pedir pra ela o buscar. 

Olhei pra moça, e ela confirmou, a conversa toda ela escutou, e estava em lágrimas. 

Usei toda a minha inspiração e o disse: 

“Moço, a vida é linda, precisa ser vivida e aproveitada. Aproveita essa oportunidade de viver pois, não haverá outra. Só lembre-se que não é preciso morrer pra falar com Deus e ainda mais... Digo que não é  preciso morrer pra fazer seu encontro pessoal com Deus. Também, não precisa voltar ao seio de sua mãe pra nascer de novo, mas volte ao seio de tua família e recomece. Ele simplesmente balançou a cabeça em sinal positivo e com os olhos me disse “obrigado” e eu com os olhos disse um “até logo”, até a eternidade. 


Não é preciso morrer pra falar com Deus, ele está no nosso ser, no nosso pensar e agir, Ele está no coração do homem. Ele está naquele alimento que o jovem se saciou. 

Aquele sopro da criação permanece em mim e em você. 




Por Mínison Domingos  |  Matipó-MG 

Por Dione Afonso  |  PUC Minas

Por Christian Maia  |  PUC Minas


31 de janeiro de 2021 

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Foto: Imagem de natureaddict por Pixabay.

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