16 May
16May

Ambientada no período da regência inglesa, a coletânea dos 9 livros de Julia Quinn se passa entre 1813 a 1827, pouco mais de uma década. O título de toda a obra é referência a uma família da alta sociedade, os Bridgertons, que são comandados pela matriarca, viúva e seus 9 filhos. Tal período regencial do Reino Unido teve seu começo em 1911 quando o Rei Jorge III foi incapacitado de governar o reino por conta de uma doença mental. Na história, quem assume o posto é seu filho, Jorge IV, porém, Quinn resolveu nos apresentar outra figura para a sua série romancista de ficção. 

Toda a série de livros está sendo adaptada para o streaming no formato de série de TV. Tal período regencial é comandado pela Rainha Charlotte (Golda Rosheuvel), esposa do Rei “louco”. A série apropria-se de um rumor histórico de que Charlotte é descendente de africanos, o que concede boa referência social e um apreço a públicos e gostos. É fato que a alta sociedade representada na adaptação se vale de popularidade, oportunidades enquanto os demais nem são lembrados. A posição da mulher também é questionável, mesmo tendo uma Rainha negra no trono. A mulher é objetivada, alvo de desejos e prazer e seu papel não é outro a não ser arranjar promissores casamentos e herdeiros. 


Menos sobre amor, mais sobre amizades 

Enquanto que a primeira temporada trouxe para o centro da narrativa, o amor e a paixão, costurados com os dilemas sociais e temas que a humanidade precisa dar mais atenção; a segunda temporada, sem tirar o fogo de um amor que queima sem consumir, traz para o centro uma personalidade improvável e, com Lady Whistledown, o tema da autoestima feminina. Agora, a terceira temporada abre as portas incluindo a amizade – um sentimento que se reflete nos espelhos da vida, do amor e de cada história. Uma amizade ferida parece sangrar mais que um amor traído. E o roteiro soube nos indicar isso muito bem. O novo ano de Bridgerton não se distancia de seu propósito, mas consegue equilibrar as discussões sociais, interesses burgueses, luta de classes junto às paixões e emoções de seus personagens. 

Como sabemos, cada volume dos livros de Quinn foca num filho Bridgerton: começamos com Daphne Bridgerton (Phoebe Dynevor), escolhida Diamante da Temporada, ao lado do Duque Simon Basset (Regé-Jean Page) entregaram cenas quentes e de amor intenso; o segundo ano da adaptação trouxe o Visconde Lord Anthony Bridgerton (Jonathan Bailey), que tentou repetir a dose de sexo e paixão do primeiro ano. Agora, o foco está em Colin Bridgerton (Luke Newton)... ou... podemos dizer, em Penélope Featherington (Nicola Coughlan) e a amizade que nutre entre esses dois mais de que sentimentos amigáveis. 


Terceira Temporada – primeira parte 

Como já nos disse a autora, “o diamante não é a única joia capaz de revelar seu brilho”. Mesmo a Rainha escolhendo o seu Diamante para esta temporada, e, ao que tudo indica, deveria ser Francesca Bridgerton (Hanna Dodd). Mas nem mesmo a Rainha está muito convencida disso, nem mesmo sendo conduzida por sua fiel amiga/orientadora Agatha Danbury (Adjoa Andoh). A família Featherington consegue, neste ano, um pouco mais de tela e de protagonismo de seus personagens. As filhas, agora casadas, também entram na roda social e lutam para salvar a família tentando gerar um herdeiro. As cenas são cômicas, até funcionam como um alívio engraçado e consegue nos entreter. 

Todas as atenções se viram para Penélope Featherington e seu desejo em conseguir se casar. A sua investida chama a atenção de um tal Lord Debling (Sam Philips), mas seu coração já, há muito tempo bate por outra pessoa, pelo amigo, por seu melhor e único amigo. É Colin Bridgerton quem deverá protagonizar esta história de amor que teve seu desabrochar numa amizade que nada tinha de intencional, mas que fez um coração arder. Contudo, a senhorita Featherington terá que resolver outra situação que também acelera seu coração: a sua dupla personalidade como Lady Whistledown. Como ela irá pôr um ponto final nesta história? 


Com mais casamentos do que o esperado 

Com a chegada da segunda parte do terceiro ano de Bridgerton percebe-se que a opinião pública está, deveras, dividida. Sentimos uma espécie de narrativa caótica e algumas confusões a respeito do rumo de cada história. Enquanto que o capítulo literário foi batizado por Os Segredos de Colin Bridgerton, o que assistimos na tela foram as grandes tensões para sustentar os segredos de Penélope Featherington. Sua dupla identidade como Lady Whistledown acabou tornando-se o centro de toda a temporada. Como um ponto positivo, manter a força e a pauta sobre a amizade foi um grande acerto para o terceiro ano. Shonda Rhimes, nome que navega por trás de todo este universo, e que também carrega uma filmografia de respeito pode ter visto nesta temporada um tapete aberto e vasto para explorar algo que vá além do amor e das paixões. 

Um pouco decepcionante, talvez tenha sido o desfecho – ou não – de Francesca Bridgerton, que se une em matrimônio com o novato no elenco, o jovem John Stirling, Conde de Kilmartin, na Escócia. Interpretado por Victor Alli, os sentimentos do conde se dirigem à jovem Bridgerton que prometeu – e não entregou – ser o diamante da Rainha para esta temporada. Por mais que no protagonismo deste ano estejam o casal Colin e Penélope, as histórias ficaram um pouco divididas: Francesca e o conde se casam; as irmãs Featherington engravidam juntas e tem suas filhas na mesma época; chega o irmão de Lady Danbury, Lord Marcus Anderson (Daniel Francis), viúvo; o segredo de Penélope precisa ser revelado; as desavenças com Eloise também precisam ser concluídas e os desejos dúbios de Benedict Bridgerton também precisam encontrar um equilíbrio. 

Com tanta coisa a se resolver, sentimos que o novo ano de Bridgerton acabou derrapando em algumas decisões e resultaram em imperfeições que não escaparam dos olhares minuciosos de quem se dedica em maratonas televisivas. Faltou ousadia e um pouco mais de inteligência para destrinchar o segredo da identidade de Whistledown. Tudo foi desconectado demais e com pistas ingênuas demais. Como a escritora Júlia Quinn não revela o segredo em seus primeiros volumes, e a decisão de Rhimes em antecipar isto pode ter causado algumas desconexões, acreditamos que este possa ter sido a grande questão. 


Whistledown é poder! Mulher é poder! 

Mesmo dando enfoque necessário – e urgente – às relações que construímos com outras pessoas pela amizade sincera e verdadeira que temos, a série não deixou de evocar algo que já é presente desde o primeiro ano: o lugar e a potência da mulher! Um dos pontos altos e muito bem tecidos desta temporada, foi a conexão da família Featherington. Pudemos assistir o quanto que a matriarca foi uma mulher que, diante das decisões erradas e não muito éticas, ela só tinha uma intenção: salvar suas filhas com um futuro próspero! Lady Portia Featherington (Polly Walker), mesmo dizendo que “mulheres não tem sonhos; mulheres têm maridos!”, Penélope não se deixou cair. E ao afirmar que “Whistledown é poder!”, quando sua amizade com Eloíse começa a se reconstituir, no fundo ela está recolocando a mulher no seu lugar de direito. 

É educativo e muito bem colocado o diálogo – inclusive, esta temporada também pecou nas construções dialogais – entre Penélope e Colin, quando este custa a entender que uma mulher não precisa ser defendida, mas apoiada e livre. E é assim que Lady Whistledown concede à Penélope Featherington e a todas as mulheres seu próprio poder e suas liberdades. Assim, Penélope se reata com a família; salva sua mãe das escolhas do passado; conecta-se com seu marido Polin depois de fazê-lo entender que sua mulher é mais forte do que ele pensa e consegue uma convivência próspera e respeitosa com suas irmãs. Agora, ela não se encaixa mais no lugar da “gata borralheira”, mas é a que salvou a todas elas!




Por Dione Afonso  |  Jornalista

Comentários
* O e-mail não será publicado no site.