26 Jun
26Jun

Depois de ter 4 indicações do elenco no Emmy de 2022 em sua primeira temporada Abbott Elementary retorna ainda mais profunda e acerta em cheio com seus personagens. Com um primeiro ano magnífico e com episódios muito bem construídos, a série criada e roteirizada por Quinta Brunson e que interpreta a professora Janine é um exemplo de humor criativo e muito bem empregado. Além de Brunson, o time principal reúne Tyler James Williams como Gregory Eddie; Lisa Ann Walter como Melissa Schemmenti; Janelle James como Ava Coleman; Sheryl Lee Ralph é Barbara Howard e Chris Perfetti é Jacob Hill. Cinco professores e uma diretora nada preocupada com seu ofício narram o dia a dia em sala de aula com seus alunos. 

O grande ganho nesta segunda temporada é que o roteiro decidiu incorporar a narrativa das salas de aula apresentando algumas particularidades da vida desses profissionais fora do ambiente de trabalho. Com uma Janine recém separada de seu namorado e o aparecimento de sua irmã e de sua mãe, somados a um Gregory tendo que lidar com seu pai e seus sentimentos de afeto pela colega de trabalho, a série ganha novo vigor. Isso sem falar de Barbara e sua situação com seu esposo adoentado e de sua apneia que, até então era um segredo dos colegas de trabalho e de Melissa que tem uma irmã também não muito afetuosa familiarmente. Brunson e equipe costuram muito bem humor e drama, risos e seriedade entre um ambiente tão comum e corriqueiro e que faz ser tão real e concreto. 


Nem só de Emmys vive uma série 

Para quem não sabe, o talento de Quinta Brunson foi descoberto quando ela era uma funcionária em uma loja da Apple. Certo dia seus vídeos no Instagram viralizaram e ganharam notoriedade e hoje ela é o que é. Quinta Brunson escreve Abbott Elementary inspirando-se em sua mãe que foi uma professora de escola pública por 40 anos. Falar de humor num ambiente tão comum como é a escola parece ser algo já ultrapassado. Contudo, Abbott Elementary é uma verdadeira aula de como fazer comédia. Primeiro ela abraça o corriqueiro, o comum, o prático e o simples. Quebrar a quarta parede interagir e olhar para a câmera faz com que aquela história contada também seja a nossa história. O que Quinta faz é nos convidar para participar da conversa. A realidades destes professores não é diferente de tantas realidades que nos deparamos hoje no sistema de ensino espalhado pelo país. 

Para o segundo ano, a série se importou com novos públicos. Mesmo sabendo da sexualidade de Jacob, desta vez ouvimos o professor branco numa escola de predominância negra dizer que é gay. Barbara precisa lidar com um aluno cadeirante e com as condições falhas de adaptação para que ele se sinta incluído na sala de aula como qualquer outro aluno é. A história é contada pelos olhos dos professores – e de um faxineiro – revelando os desafios que precisam enfrentar para que o ensino não chegue fragmentado até o aluno. O novo ano também traz a ameaça capitalista. Uma escola particular e mais famosa, mais valorizada pelo poder público ameaça a Abbott Elementary e este elenco mostra como devemos fazer quando um programa de governo coloca em risco o ensino e o futuro de nossos alunos. 

Temos um humor inteligente e criativo graças a um roteiro afiado que nos entrega um bombardeio de piadas e risadas muito bem colocadas. Diálogos mais intensos, profundos e sérios também fizeram com que o novo ano se aproximasse ainda mais da realidade concreta de cada professor e de suas reais situações. Não estamos diante de uma obra sentimentalista. Janine é a grande estrela desta temporada – ainda mais que na primeira – e foi inteligente em deixar para o futuro o resultado do que sente pelo colega de trabalho. Mas é um acerto quando inicia um drama, como o que tem com a irmão por exemplo, mas não deixa pra depois. No mesmo episódio a história começa e termina. Assim acontece com a mãe e com a apneia de Barbara. 


Um expoente na comédia televisiva 

É inovadora! Não tem como negar que Abbott Elementary está renovando e inovando o caminho futuro do humor. O humor sério que nos faz rir e pensar ao mesmo tempo. Um humor verdadeiro e sem apelações. Um humor com familiaridade. Por exemplo, ao vermos professores de todas as idades representados nestes cinco profissionais da educação, Brunson coloca ali todas as realidades e cada uma com sua peculiaridade. Barbara é a que tem mais tempo de casa, sofre com problemas de saúde, mas é uma espécie de conselheira dos mais novos. Tem sensibilidade e medo do futuro. Gregory é o novato. Está aprendendo. Tem medo de não dar conta, mas se sai muito bem quando se esforça em aprender a linguagem das crianças e o universo delas. Jacob teme o isolamento, a exclusão e a solidão. É branco numa escola de periferia e ainda é gay. Janine não tem vida social e tudo o que vive e respira é a escola, é pela a escola e nada mais. Melissa é a forte e que insiste em não criar laços porque pensa dar conta de tudo sozinha. 

Nesta temporada Ava Coleman, a diretora que não exerce sua função ganha mais profundidade também. Brunson sente que ainda não é o momento de explorá-la, mas não deixa de incorporar elementos centrais de seus sentimentos. Ve-la em sala de aula por um episódio deu à personagem novos caminhos que podem ser explorados futuramente. A Janine de Quinta Brunson é aquela personagem que decide ser “a mãezona de todo mundo e em todos os lugares”. Não se aquieta enquanto todos não estão bem e felizes. Não consegue descansar se a desumanidade passa pelo corredor. É hiperativa, parece ter um déficit de atenção, mas é o coração da série e da escola. 

Enfim, não dá pra seguir a vida sem deixar que Abbott Elementary passe por ela. Ela é uma escola de formação sobre a vida, sobre os sentimentos, sobre política e sobre você. Sobre eu, sobre nós. Quando assistimos ao primeiro ano, sentimos um pouco de receio sobre o seu futuro, mas ela seguiu firme e se consolida de vez como um grande achado na TV e nas premiações.




Por Dione Afono  |  Jornalista

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