22 Feb
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“A inspiração para a história veio de questões vistas no nosso cotidiano para compor os personagens e as situações que nos movem. A situação política dos últimos anos tem uma forte influência nos roteiros, sobretudo a saída do Reino Unido da União Europeia. Em 2016, tínhamos separatismo acontecendo extensivamente na Europa, mas as vibrações apocalípticas do fim do mundo não estavam sobre a mesa. Trata-se de uma série com tribos que estão de um lado distópico, mas nem todo mundo por ali é distópico. É um mundo completamente novo para ser descoberto”.     

[Philip Kock, em entrevista à Variety].   



Continuamente vivemos nos perguntando onde a tecnologia vai parar daqui 100 anos. Com tanta evolução, e experimentos, o que faremos com tanta tecnologia e avanço? Sempre levantamos nossas teorias, damos explicações, artigos e manuais são levantados afim de orientar a sociedade para seus riscos que são continuamente atrelados aos pontos positivos e de grande relevância para a humanidade. 

Uma humanidade a serviço e escrava da tecnologia, com certeza é um dos pontos mais cruciais e de grande necessidade que nós temos que nos ater cotidianamente. Pois a máxima contrária onde a tecnologia esteja a serviço de nós é o grande ponto a ser desenvolvido. Acontece que luas luzes, o vislumbre e as oportunidades que o horizonte tecnológico nos fornecem acabam que nos apetecendo mais que uma rotina mais simples e conectada com a mata, o verde e a família.

Outra coisa super relevante de se levantar: é preciso superar essa ideia de que fios, cabos, chips, celulares e computadores ser contrária à ideia de relações interpessoais, valorização da natureza e contemplação da biodiversidade. Não. Uma coisa não é contrária à outra como nós pensamos e defendemos. É preciso encontrar a harmonia entre os dois polos. É preciso buscar um ponto de equilíbrio onde uma conviva e defenda a outra. 


O colapso tecnológico (ATENÇÃO: contém spoilers da primeira temporada) 

Escrita por Philip Koch, Jana Burbach, Benjamin Seiler, a nova série da Netflix lançada nesse sábado (20), Tribes Of Europe atinge o terceiro lugar no Brasil entre as mais assistidas. Koch consegue trazer um continente eu foi arrasado no ano de 2074 por um colapso tecnológico. Toda a Europa da noite para o dia se torna um completo apagão. Toda energia elétrica e toda tecnologia simplesmente desaparece. No entanto, uma espécie de “grupo” parece sobreviver ao apagão e permanecem “sobreviventes” à ameaça. 

A série inicia com o conceito de tribos. Inicialmente conhecemos a tribo dos Origines: um povo da floresta que vive sem nenhum contato tecnológico. Com o lema “toda vida é uma só”, eles são ensinados a viver de maneira agradável e agradecida a única vida que possuem. Um lema com profunda filosofia de vida, os Origines têm uma linda lição de moral e ética, grande consciência ecológica e vivem em harmonia com a natureza. A tribo dos Escarlates são inspirados em guerra e comércio bélico. A honra deles está em primeiro lugar, e, parece serem um pouco tanto ambiciosos e oportunistas. A tribo dos Corvos são taxados como os vilões da história. Com o lema “até a morte”, eles são a supremacia, o poder, a política, os sobreviventes. Nada os destroem, nada os derruba, nada e nem ninguém é maior que eles. No fim da temporada nos é apresentada a tribo das Fenen.  

A direção de Philip Koch e Florian Baxmeyer arrasta a história inicial, mas vai conseguindo nos dar um gostinho forçado de querermos ver onde que tudo vai parar. É curioso numa primeira instância assistir um continente todo como a Europa completamente vazia, abandonada, dividida e sem nenhum respaldo social e potência comercial. Digamos que o lugar mais superestimado do globo terrestres e para onde todos os olhares da humanidade se voltam não é mais o centro das atenções e se vê completamente destruída e devastada. Claro, a série não diz que o resto do mundo sobreviveu, isso é só um gostinho de “vitória” por quem sempre ditou as regras. 


Foco, enredo e trama 

A história segue o trio de irmãos Liv (Henriette Confurius), Elja (David Ali Rashed) e Kiano (Emilio Sakraya) da tribo dos origines. E daí já percebemos onde que a série quer nos levar. Não é a toa que o ato heroico nos seja introduzido pela tribo que não é munida de tecnologia e nem de relevância “urbanizada”. Num dia comum os irmãos entram em contato com uma nave tecnológica que cai próximo ao local em que o crã deles se encontra. Temerosos pelo o que poderia estar por vir, o líder e pai vai investigar o elemento estranho. 

A série procura encerrar o primeiro arco o mais breve possível nos fazendo ficar interessados no que pode vir. A tribo é invadida e atacada, e os irmãos se veem separados. Liv é salva pelos escarlates; Kiano torna-se escravos dos corvos e Elja se alia ao estranho Moses (Oliver Masucci) com um cubo tecnológico em mãos e com a missão de encontrar uma tal arca. A série não emplaca com o suspense. Na verdade, ela é bem superficial quanto a isso, mas ao fechar o primeiro arco e abrir três focando na jornada de cada irmão ela começa a ganhar pontos interessantes e, no mínimo, curiosos. 

Liv, ao se recuperar na sede dos escarlates, empreende a angustiante missão de salvar o que resta de seu povo e sua família.  Henriette Confurius entrega uma personagem que não teve oportunidade e nem tempo de tela para crescer. Liv não desenvolve seu arco e as situações vão patinando no decorrer dos episódios. Quem nos dá um pouco de humor é o pequeno Elja que com Moses vivem uma aventura com o cubo tecnológico em busca da Arca de Atlantis. E quem nos garante um ganho criativo para a próxima temporada é Elja quando se encontra com a misteriosa Arca. O que ela faz, nós vamos ter que esperar pra saber. 


Discurso tecnológico e ação 

O discurso narrativo que a série nos entrega é o fato de sermos uma humanidade atrelada aos brilhos e seduções da tecnologia. Uma tecnologia que nos aliena e nos embriaga de vícios e de doenças corporais e espirituais que nos afastam de toda e qualquer relação humana saudável e feliz. 

Com Emilio Sakraya, o Kiano aprisionado pelos Corvos, vemos o quão maléfico isso pode se tornar. Ele nos deu grandes cenas angustiantes, sedutoras e muito, mas muito sofridas. Kiano consegue sua liberdade pagando um preço muito alto. Caro demais para um jovem que tem toda uma vida pela frente. Sakraya nos entrega uma atuação impecável e que pode nos assustar muito ainda no desenrolar dessa história. 

Mesmo a série de ficção e de tom apocalíptico ter apresentado um início desconexo e meio confuso, o que Jogos Vorazes não soube fazer e o que American Gods não deu conta de adaptar (o deus americano da tecnologia), Tribes Of Europa reuniu num único enredo. Demasiada tecnologia, sem controle e sem regras éticas é um mal que a sociedade pode estar disposta a mergulhar podendo pagar um preço caro, como um colapso global e a perde de toda ordem e harmonia terrena. Isso fica muito claro para nós. 

Tribes Of Europa está disponível na Netflix com uma temporada de 6 episódios. 



“Toda vida é uma só” 

(Lema da Tribo Origines)



Por Dione Afonso 

Jornalismo PUC-Minas

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