30 May
30May

Não é apenas a carreira e a história de Tom Cruise que ganha centralidade e honrarias no novo Top Gun. Vemos que a nova história se preocupou em dar a cada narrativa pessoal um sentido, até mesmo intimista. Para quem viu Cruise no auge dos seus 24 anos em Top Gun – Asas Indomáveis, ao lado de um Val Kilmer também jovem, sente-se agradecido e feliz ao se encontrar com esses atores quase 40 anos depois. Top Gun – Maverick apresenta um Cruise com o peso dos seus 60 anos de idade e uma mente jovem e disposição impecável para dar o seu melhor frente as câmeras. 

Na direção, o britânico Tony Scott, irmão do consagrado Ridley Scott (1944-2012) dá lugar ao americano Joseph Kosinski. Kosinski faz mais uma homenagem ao direcionar a obra a Scott in memorian, nos créditos finais. Sua marca na cinematografia são os efeitos computadorizados em seus 10 anos de carreira. Kosinski, que contou com uma equipe de roteiristas muito bem preparados, soube colocar Cruise no topo da narrativa ao mesmo tempo sem tirar os personagens de seus papeis. É como se não houvesse secundários na história. Até mesmo na hora de reconhecer uma mulher piloto como Top Gun, Cruise e Kosinski deu a esse plano a sua relevância. (Atenção, pode haver spoilers a partir daqui).   


De 1986 a 2022, novos “Top Guns” se apresentam 

Em 1986, Anthony Edwards fazia as vezes do melhor amigo de Maverick, o Goose. Agora, é a vez de Miles Teller, o filho que adota o mesmo codinome de piloto do pai, “Goose”, que interpreta a mesma cena tocando um piano num bar. A nostalgia nos toma conta nessa hora e Cruise, assiste distante, ainda se culpando pelos erros do passado. Se antes Maverick era escolhido para ser um “Top Gun”, agora ele recebe a missão de treinar os próximos pilotos no programa. E eis que o jovem Goose é um deles. Quem guarda um rancor forte do passado, desde a morte do pai que assistimos em Top Gun – Asas Indomáveis. Maverick tem que lidar com uma missão suicida. Como ele mesmo afirma, “alguém não sairá vivo dessa”. 

Val Kilmer também retorna. Seu personagem Tom Kazanski, de codinome “IceMan” agora aposentado, com problema na fala – o cinema soube aproveitar sua condição física muito bem e sem constrangimentos – representa para Cruise o velho amigo que aconselha continuando dando seus puxões de orelha. Digamos que na sequência, quem faz esse papel é o novo personagem, aluno da “Top Gun”, Glen Power, que usa o codinome “Hangman”. Hangman trava com Goose uma relação muito semelhante à que existia entre Maverick e o pai Goose. Esses elementos aproximam a sequência a também um reboot, o que não desmerece a narrativa apresentada. 


Um filme de homem para homem, certo? 

Errado. Não só de homem para homem, sobretudo os quarentões ou quem pareia a idade com Cruise. Mas é um filme sobre humanidade. Por mais que a tecnologia a evolução dos aviões caça e o poder bélico das armas e bombas, é o fator humano que determina o sucesso de uma missão. Cruise, diante de seus alunos, Goose, Hangman, Fênix (Monica Barbaro), Bob (Lewis Pullman), Fanboy (Danny Ramirez), Payback (Jay Ellis) nunca desperdiçou a regra, mas, ao lado dela, elevou as potencialidades humanas ao seu máximo. “Não é o avião, é o piloto!”, frase memorável e digna de ser publicada para a posteridade. Acreditar no potencial, acreditar na nova geração e estar aberto a novas perspectivas e para o perdão, são grandes lições que Top Gun Maverick, resgata do longa de 86. 

Há quem julga a obra, classificando-a como um produto que exala masculinidade. Se isso acontece, qual é o problema? Em nenhum momento a obra com Tom Cruise desrespeita as ordens sociais de uma comunidade; em nenhum momento há tons machistas ou elementos que suscitam o preconceito, homofobia. Muito pelo contrário, a cena entre Cruise e Jennifer Connelly no bar, que interpreta a Penny, é um ato de muito respeito ao sexo oposto, sem apelações e sem cair no ridículo. Isso, méritos da equipe de roteiristas. O encontro de Cruise com Kilmer sela esse respeito para quem estrelou juntos no cinema quase 40 anos atrás figuras sensuais, eróticas e viris para as donzelas da época. 

A aposta em não substituir Maverick e nem de continuar seu legado por outras perspectivas, por exemplo a morte do personagem, fez do personagem um homem solitário, perdido no tempo e no espaço, sem ambições – sobretudo, nunca aceitou subir sua patente – sem família, sem filhos, sem perspectivas de futuro. Maverick torna-se um homem marcado profundamente por um luto insuperável que teve que vencer anos mais tarde, ao ser confrontado com o passado afim de aceitar o futuro. Um revival que entende não poder viver só do passado, mas é preciso voar pra cima e em frente.




Por Dione Afonso  |  PUC Minas

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