22 Sep
22Sep

Ele é um pouco extravagante em suas ideias -  um entusiasta de alguns ramos da ciência. Até onde sei é um sujeito bastante decente. Não tenho ideia de quais são seus interesses. Creio que é versado em anatomia e é um químico de primeira; mas que eu saiba, nunca fez um curso regular em medicina. Seus estudos são muito desconexos e excêntricos, mas acumulou um volume de conhecimentos insólitos que espantaria seus professores. Não é fácil fazê-lo falar livremente, embora possa ser bastante comunicativo quando lhe dá na veneta.

[DOYLE, 1887, Um estudo em vermelho].


 

Por mais de 130 anos, o detetive britânico Sherlock Holmes continua ultrapassando décadas, influenciando gerações e sempre inaugurando novos conceitos na cultura pop. Sir Arthr Conan Doyle [1859-1930] em 1887 com Um Estudo em Vermelho, apresenta um homem enigmático, persuasivo e, no mínimo, estabanado. Sherlock Holmes, um investigador policial que encantou várias gerações com seus romances e suas aventuras pitorescas nos mais belos cartões-postais da Inglaterra.

Holmes não é o primeiro detetive do gênero literário, houveram outros antes dele e também, pós-Holmes. No entanto, é indiscutível a marca de Doyle conseguiu imprimir com o seu mais famoso personagem. Sherlock é carismático, atrapalhado, mas sempre atento. Holmes é cômico, curioso, as vezes precipitado, mas sempre misterioso.

O primeiro encontro entre Watson e Holmes já descrito nas primeiras páginas de 87 é cômico e, ao mesmo tempo impensável. Holmes sobre Holmes. Holmes para Watson. Watson sobre Holmes. Por fim, é o próprio destilando sua própria complexidade humana e transversal em meio ao constructo subjetivo da própria existência. Enfim, é esse ser confuso e atrapalhado, perdido e sem objetivo que encanta o público e inspira uma legião de leitores pelo mundo. Conan Doyle se consagrou no gênero do romance policial com o melhor personagem que ele criou: Sherlock Holmes.


Do papel para a película

“Quando se chega a dar bengaladas nos cadáveres nas salas de dissecação, a coisa está sem dúvida assumindo uma forma bastante esquisita”, claro que esse diálogo intencional e injusto continua. Holmes continua “se vendendo” ao rapaz que tonar-se-á seu escudeiro, um grande amigo. Talvez mais que amigo.

O sucesso de Conan Doyle já não cabia mais nos papeis, as tintas das canetas e os tocs das datilografias não davam conta de suprimir todo o sucesso que o detetive britânico provocara. Era preciso um espaço maior de discurso e de representação. Era necessário tirar a história do papel e traze-la para os raios de sol sobre as grades das casas de Baker Street 221B, Londres. Watson descreve Holmes como “boêmio” em seus hábitos e estilo de vida. Em O Cão dos Baskervilles [1900], Holmes é descrito pelo amigo como tendo “aquele amor felino pela limpeza pessoal”. Holmes é “um excêntrico, sem qualquer consideração pelos padrões contemporâneos de arrumação ou boa ordem”.

A primeira tentativa de criar um universo do Detetive Holmes foi leva-lo para o teatro. Essa empreitada teve o objetivo de levar os Contos do “cânone” de Conan Doyle para os palcos. Mas, foi no cinema que o Detetive ganhou visibilidade universal. Tanto no cinema como na TV, o detetive ganhou várias versões. Talvez seja o personagem literário que mais ganhou versões na cultura televisiva e fílmica. Nem mesmo os super-heróis das aclamadas DC e Marvel interpretaram tantas versões assim de um personagem em específico.

Enfim, nessa nova narrativa, os cineastas enfrentam a difícil missão de adaptar uma história investigativa, sob um método dedutivo para as telas. Não é uma tarefa fácil, até hoje não encontramos uma adaptação perfeita. Mas temos bons detetives que fazem a nossa alegria.


“Dr. Watson, Mr. Sherlock Holmes”, disse Stamford, apresentando-nos”

Sherlock Holmes está entre nós há mais de 30 anos. Hoje soma-se mais de 200 filmes com variadas interpretações do detetive. Em 1900, ainda na era do cinema mudo, tivemos Sherlock Holmes Baffled e, desde então, o detetive começou a ocupar cadeiras significativas nas sessões de suas histórias mirabolantes pela capital britânica.

Alguns atores se destacaram interpretando o personagem. Basil Rathbone, Jeremy Brett, Christopher Lee, Michael Caine e Rupert Everett são alguns dos que deram vida ao detetive. Hoje, a fama está nas mãos de Robert Downey Jr. e em Benedict Cumberbath. O primeiro tem dois filmes na carreira com a promessa de uma trilogia a caminho, já o segundo destacou-se numa série de TV chamada Sherlock produzida pelas BBC e WGBH.

Na série lançada em 2010 Sherlock Holmes vive numa Londres moderna, como nos dias de hoje. Com esse pano de fundo, tivemos a oportunidade de ver um detetive com mais recursos tecnológicos e mais inteligente. Até mesmo o uso de narcótico é evoluído. Se numa vida mais pacata, o detetive era viciado em cocaína, em 2010, ele evolui para a nicotina.

Basil Rathbone, Jeremy Brett e Eille Norwood foram os que mais trabalharam vivendo o detetive. Rathbone até hoje carrega o sucesso que foi quando interpretou o detetive britânico. Ele é consagrado como uma das melhores atuações de Holmes. Brett e Norwood também trabalharam por muitos anos vivendo o personagem em suas produções.


Um início com Basil Rathbone e uma nova era com Henry Cavill

Sem dúvidas, o novo Holmes que estamos prestes a presenciar na produção da Netflix é totalmente inovadora. Vamos nos deparar com um Sherlock Holmes bonito, atraente, inteligente, malhado, viciado talvez? Ainda não sabemos. Mas algo que fugirá totalmente do “cânone” de Conan Doyle. A escalação do ator no filme que tem o nome da irmã Enola Holmes é uma surpresa.

Enola Holmes é irmã de Sherlock. Uma personagem que não pertence aos cânones de Doyle. Alguns acreditam que seja uma história derivada e que não tem a intervenção do escritor oficial. Deixando toda essa discussão de lado, a nova produção apresentação um drama policial focado em Enola, em que se discutirá o fato da jovem ter herdado os talentos atrapalhados do irmão. Bem ao estilo de menina travessa e avessa a regras.

O nome Holmes torna-se mais que uma literatura, mais que um filme. Sherlock Holmes passa um legado de representação, adaptação e consagração de um estilo de cultura: o drama policial. E Holmes consegue afirmar que tal trabalho é passível de adaptação e reinvenção em qualquer esfera da dramaturgia, da escrita, da encenação, da produção, da gravação.

As produções originais também tratam de trazer a diversidade e a representatividade para uma história que é consagrada com essa de Conan Doyle. Temos também uma Miss. Sherlock, interpretada pela Youko Takeuchi. Trata-se de uma versão feminina na série japonesa Miss Sherlock lançada em 2018. No elenco, Takeuchi é Sara Sherlock e Shihori Kanjiva é Dra. Wato.

Portanto, para concluir esse time, temos Millie Bobby Brown dando vida a Enola Holmes no filme que ganha seu nome.


“Vejamos... quais são meus outros defeitos? Às vezes fico deprimido, e passo dias a fio sem abrir a boca. Não deve pensar que estou amuado nessas ocasiões. Basta deixar-me em paz, e logo volto ao normal. E o senhor, que tem para confessar? É melhor que dois sujeitos saibam o pior um do outro antes de começarem a morar juntos”

(Sherlock Holmes, 1887, p. 17)



Por Dione Afonso

Jornalismo PUC-Minas

Comentários
* O e-mail não será publicado no site.