13 Sep
13Sep

“Minha própria família não aceita a minha esposa pelo fato dela ser negra. Eu sou um homem branco, dos olhos verdes, descendente de italiano. Minha bisavó era italiana. E a mulher que escolhi fazer parte de minha vida é negra e puramente brasileira. É o ser humano mais incrível e mais lindo que eu já vi em toda a minha vida. Diz ela que a bisavó dela era índia. Isso me fascinou ainda mais. Por conta do meu casamento meus irmãos e meus primos, até mesmo amigos se afastaram de mim. Me chamaram de louco e de burro. Eles não disfarçaram em nenhum momento o preconceito nojento, não conseguiram amar quem é diferente deles. Eles são sangue do meu sangue. Mas minha esposa é alma da minha alma. Num mundo igual ao que vivemos, os laços de fraternidade, de amor, de respeito é algo que deve ultrapassar o mero traço de sangue. Família é quem nos ama e nos aceita na diferença que somos e escolhemos ser.”. 

[ROBERTO SILVA E SUA ESPOSA, ANTÔNIA, janeiro de 2019].

 

 

 

Malik Vitthal dirige Operação Obscura pela Paramount Studios. Um thriller de ação, mistério e suspense sobrenatural que mexe bastante com temas bem espinhosos entre policiais e a corrupção em nome de uma “certa justiça” que é usada para encobrir uma morte inocente.

Renee Lomito (Mary J. Blige) é uma policial já experiente e, no longa ela está se recuperando com muita dor de um recente luto de seu filho. Ela implora para retornar para a Corporação Policial de seu Distrito e, recebe o turno da noite sendo responsável em acompanhar o novato Daniel Holland (Nat Wolff). As tensões sociais referentes à discriminação racial e preconceito já ficam claras nas primeiras cenas de Vitthal. Uma comunidade negra repudia a ação policial numa determinada rua.

Lomito e Holland se veem numa situação bem hostil e recuam. Já dá pra perceber o que o filme irá nos entregar. No enredo há uma pegada sobrenatural, algo da ficção que serve mais para nos entreter. O pano de fundo é bem mais eloquente e grave. Lomito é também uma mulher negra traumatizada pela violência policial do Departamento de Polícia de Los Angeles. A força bruta no tratamento com os civis nunca foi algo que ela aceitou.


Corrupção policial

O desfecho do filme dá-se quando policiais atiram num jovem surdo. O ato da legítima defesa é sempre uma desculpa inapropriada para fazer com que oficiais se safem de suas responsabilidades penais. A realidade hostil que o longa apresenta é um contexto social que muitos de nós enfrentamos. Na história que narramos de Antônia e Roberto, vemos que o preconceito é algo enraizado até mesmo no núcleo familiar onde nem mesmo a fraternidade é capaz de sarar essas cicatrizes.

E mais: Holland se entrega ao suicídio por, mesmo não concordando em encobrir o crime dos parceiros policiais, ele só desejava realizar seu grande sonho jovem em se tornar um policial de respeito e justo. Nessa história, mais um sonho é tirado de alguém. O problema é que ainda nos deixamos levar por estereótipos sociais que definem quem é ruim e quem é bom. Quem é viciado e quem não é. Quem é capaz de empunhar uma arma e atirar e quem não é.

O longa de Vitthal é um híbrido de terror com suspense e dramas sociais reais. A escuridão que as cenas nos dão é uma ambiguidade: o que é mais escuro, nosso rancor e preconceito ou simplesmente a pele de quem é humano como nós?


“Tenho coragem suficiente pra deixar você viver”

Na série da DC Arrow, Oliver Quenn (Stephen Amell), é desafiado por um de seu vilão quando tem a chance de liquidá-lo: “Você não tem coragem de me matar Oliver”, na verdade, a coragem maior era a de deixa-lo viver. Cito essa produção por também fazer jus a uma “certa justiça” baseada numa vingança desmedida. Oliver assumiu o compromisso de liquidar todos que “falharam com sua cidade”.

Não há uma ligação direta com o filme de Vitthal, mas tem relações narrativas coma as histórias que decidimos escrever e deixar gravado nas memórias para a posteridade. Nós somos o que decidimos ser e viver. Experimentar. Em Operação Obscura, Lomito decide desmascarar o crime hodiondo que seus companheiros de profissão cometeram. E uma das lembranças mais significativas que a policial tinha de seu filho era quando ele dizia que a “mamãe escolheu uma das profissões mais perigosas. Por que mamãe, a senhora escolheu ser policial? Não dá pra te ajudar nisso, eu não consigo te proteger...” Lomito, via nisso que a sua missão de salvar quantas pessoas pudesse, era honrosa e nobre.

O elemento fictício sobrenatural acaba ficando em segundo plano no conjunto de toda a obra, fotografia e enredo. As questões sociais de confiança na autoridade e respeito e convivência com o diferente de nós é ainda mais urgente e ganha a nossa atenção. Claro, não tão focado assim como deveria, mas, é um ponta pé para que nosso compromisso com a vida esteja sempre em pauta diante de nós.

Somos nós que decidimos se a nossa história vale a pena ou não! Nós que responderemos o quão importante nossa história será. Se fará a diferença ou não!



“Quando pessoas são prejudicadas, ou estão com problemas, elas tendem a fazer escolhas erradas. Mas sempre terão a oportunidade de darem a volta por cima. Todo guerreiro deve aprender a mais simples verdade de que a dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional.”

(“Arrow”, seriado da DC transmitida pela CW)


 

 

Por Dione Afonso

Jornalismo PUC-Minas

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