15 Apr
15Apr

“Não há nada quebrado em você para que seja preciso consertar”.    

[O Som do Silêncio].   




O Som do Silêncio (Sound Of Metal), longa de Darius Marder está concorrendo a 6 Categorias da edição do Oscar de 2021. Trazendo uma experiência sonora ímpar, o filme foi digno de experiências acústicas grandiosas numa sala de cinema. No entanto, mergulhados em dias de pandemia, a produção foi lançada diretamente no serviço de streaming na plataforma da Amazon Prime Video. 

Riz Ahmed é indicado a Melhor Ator por sua atuação impecável de um músico baterista que perde a audição. Por conta dos altos decibéis expostos sem cuidados por shows de Rock Metal, o ator teve que mergulhar numa experiência difícil de alguém que não consegue superar uma falha no sistema humano sensorial. Um enredo digno de fortes emoções e grandes lições de vida, os roteiristas garantiram que mais uma indicação fosse levada ao oscar na Categoria de Melhor Roteiro Original.   


“O som do silêncio” é ensurdecedor 

A premissa principal do filme retrata um romance de estrada de um casal que vive num trailer de cidade em cidade com seus shows de rock. Junto à vocalista Lou (Olivia Cooke) Ruben Stone (Riz Ahmed) é baterista e o casal apresenta-nos uma realidade regada de felicidade e uma história bem forte de superação. Ruben é um viciado que está limpo há quatro anos e Lou é de uma família muito rica que também consegue romper com o passado para viver uma história ao lado de Ruben, mesmo que esse passado insista em ser lembrado com as cicatrizes em seu pulso. 

Custa-nos perceber que Lou e Ruben, originalmente são de mundos diferentes e distantes, no entanto, o enredo sabe por onde quer seguir e consegue nos prender ao drama do protagonismo de Ahmed que aos poucos vai se entregando totalmente aos dramas e traumas de Ruben. O Som do Silêncio não é pacífico, muito pelo contrário, ele é gritante, ensurdecedor, sobretudo quando você tem tudo aquilo que grita de si e que explodem como experiências difíceis de serem superadas. Lou e Ruben eram um enquanto um servia de apoio e parceria para o outro. Vemos diante de nós um jovem casal que sente dificuldades de amadurecimento frente a traumas sociais e situações emblemáticas difíceis de serem vencidas.   


Uma surdez também social 

Ruben vivia para a música e para Lou. Lou vivia para a música, mas... Essa história se rompe quando Ruben descobre que os altos decibéis do rock metal estourou seus tímpanos fazendo-o perder mais de 80% de sua audição. Mais tarde, atingindo a 98%. Isso o impossibilita de continuar exercendo seu trabalho de músico. Ruben se desespera e o jogo de câmeras partindo de sua perspectiva deixa o telespectador num sentimento de angústia ao perceber o silêncio ensurdecedor que atormenta o personagem. 

É impressionante. Você se sufoca do outro lado da tela. O perfeito jogo de câmeras faz o público se sentir surdo e sufocado numa realidade sem som, sem voz, sem barulho. Todo o filme é visto pela perspectiva de Ruben. O enquadramento perfeito sob seu ponto de vista é ideal para que quem o assiste tenha sensação de que a surdez salta da tela e nos atinge também. (assista ao filme de fones de ouvido). 

Os efeitos sonoros tiveram um trabalho minucioso também ao serem afetados pelo drama de Ruben. Do nada, tudo se emudecia. Do nada, nada se ouvia. Era vazio. No decorrer da primeira hora do filme Ruben luta para recuperar sua audição e não aceita que “não há nada nele quebrado para que seja consertado”. Um segundo caminho havia sido proposto por uma comunidade onde Diane (Lauren Rodloff) ensina a língua de sinais. O som da fala nesse lugar era quase que um pecado. Mesmo Ruben vivendo e aprendendo novas formas de se comunicar, ele não aceita a sua nova condição e estilo de vida. De todas as formas ele tenta buscar recursos para “consertar o que estava estragado em sua vida”. Com isso, ele viola a única lei da comunidade e é expulso. 

Ruben tenta voltar à vida de antes e tudo, mas nesse ponto da vida, do filme e até de quem assiste do outro lado da tela, o silêncio tornou-se uma amiga e qualquer barulho, por menor que seja, torna-se algo que incomoda. 


Aceitar a sua condição na inteireza humana 

Uma reflexão que nos cabe aqui é que o personagem de Ahmed é um jovem homem que não consegue aceitar que há momentos da vida em que uma experiência nos afeta tanto, a ponto de, ao sair dela, algo, um pedaço de nós fica para trás. Ruben não se aceita. A autoaceitação é um passo essencial para que nós nos sintamos presentes, livres e amados. O amor a nós primeiramente parte de nós. Aceitar o silêncio, a surdez, a cor, a pele, a voz, o cheiro e cada pedacinho de nós que nos faça ser quem somos é um exercício de liberdade pessoal. 

O filme é sobre introspecção. E por isso que se deve ser exaltado a atuação de Ahmed. Um exercício introspectivo exige conversão, transformação interior. Tem muito mais a ver com um exercício interno de superação que um exercício externo de concentração. A introspecção te pede músculos da consciência, do coração, músculos interiores, um exercício que não se é adquirido levantando alteres ou fazendo abdominais. 

O Som do Silêncio não é um filme para ser assistido numa tela, ele é pra ser ouvido pelo coração e respeitado pela vida. A história que nos é transmitida, mais do que pelas cenas e jogos de câmera é vivida pelos sons e pela ausência deles. Além de Melhor Ator e Melhor Roteiro Original, o longa de Marder ainda foi indicado a Melhor Filme; Melhor Ator Coadjuvante; Melhor Montagem e Melhor Som. 


O filme está disponível na plataforma da Amazon Prime Video. 




“O som do silêncio é ensurdecedor” 

(Sound Of Metal, Darius Marder, 2019, Amazon Prime Video.)





Por Dione Afonso Jornalismo PUC-Minas

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