18 May
18May

Você já parou pra pensar em quantas vezes ficou interessado em saber sobre determinada cena, se foi o artista em questão ou se foi um time de dublês que realizou? Não obstante, nós só vemos os dublês ganhando notoriedade e até mesmo, ganhando as câmeras quando o artista em primeiro plano se lembra de agradecê-lo publicamente ou quando o próprio dublê sofre alguma tragédia em cena. Outro caso é quando artistas como Tom Cruise revelam que quase 100% de suas cenas são realizadas sem o recurso de dublês, neste caso o dublê é lembrando quando ele não existe em tal trabalho. Triste isso, não? 

O cineasta David Leitch, responsável pelo recente Trem-Bala (2022), também por Deadpool 2 (2018); Atômica (2017) entre outros agora chega com O Dublê, uma comédia bem despretensiosa estrelada por Ryan Gosling, Aaron Taylor-Johnson e Emily Blunt. Enquanto Blunt é uma diretora em potencial de longas de ficção-cientícia e outras histórias de ação, Gosling interpreta um dublê de Tom Ryder (Johnson). O trabalho de Leitch utiliza de uma metalinguagem bastante escancarada na qual o filme conta a história de um filme na qual o dublê precisa lidar com algumas questões trabalhistas e o próprio dublê utiliza de dublês para as cenas de ação. Uma história dentro de outra tentando contar uma terceira. Confuso, não é? 


Um remake que poucos sabiam 

Pouca gente sabe, mas O Dublê trata-se de um remake de uma série de TV dos anos 1980 que foi criada por Glen A. Larson que se chamou Duro na Queda. Estrelada por Lee Majors, a obra se destaca por ter dado a chance de evidenciar esse time de atores e atrizes que agem até mesmo na frente das câmeras dando a tonalidade certa para cenas de ação, cenas perigosas e muitas outras situações que os artistas de primeiro plano não fazem ou, até mesmo, recusam-se a fazer. Agora, nas telonas, vemos Colt Severs (Gosling) interpretando um dublê veterano. Colt é ex-namorado de Judy Moreno (Blunt), uma diretora novata que se arrisca em sua gravação de um blockbuster sci-fi

A relação entre Judy e Colt é costurada com o tom de humor, carisma, boas risadas e piadas. É uma decisão criativa de roteiro ter colocado um acidente quase fatal que impossibilitou Colt de exercer sua profissão e, assim, afastar-se de sua namorada por anos. Por isso, seu retorno é alinhado a outros interesses vilanescos que, se tivessem sido melhores construídos, o longa teria subido mais um grau em sua avaliação crítica. Este papel ficou por conta da atriz Hannah Waddingham que fez Gail Meyer. Gail era uma espécie de produtora ao lado de Judy, mas que ambiciava destruir a carreira da colega em ascensão afim de conseguir o prestígio da fama. 

David Holmes – O Menino Que Sobreviveu (2023) é um documentário da HBO que acompanha a comovente história de resiliência do ginasta David Holmes, amigo e dublê do ator Daniel Radcliffe nos filmes da saga Harry Potter. Holmes sofreu, durante as filmagens, um grave acidente que o deixou paralisado para o resto da vida. O filme-documentário narra toda a trajetória de Holmes que, ainda criança já havia sido escalado para ser dublê de Radcliffe. No penúltimo dos oito filmes, Holmes, enquanto estava gravando uma cena de ação do ator principal da saga, ao ser arremessado por um cabo, como é comum fazer, ele levou um efeito chicote o que fez quebrar seu pescoço e lesionar sua medula na parte cervical. Holmes precisou lidar com a tetraplegia e, percebendo que sua perda de movimentos estava progredindo, o jovem ator entrou num estado de depressão. Debilitado, ele encontra na amizade sincera de Radcliffe e dos colegas dos set como Emma Watson, Tom Felton, Rupert Grint, David Yates entre outros, uma esperança para viver. Radcliffe e Holmes, juntos, decidiram contar essa história. Um sinal de verdadeira resiliência e respeito por tantos dublês que trabalham arduamente diante das câmeras e que não são reconhecidos.


Entretenimento gratuito e a crítica ao Oscar 

Todos os anos, diante de cada lançamento cinematográfico, o público sempre fica na espreita pelo o que irá chamar a atenção da crítica. Eventos e festivais como o Sundance, Cannes, Globo de Ouro e o Oscar sempre ficam atentos ao que se está sendo lançado e ao que o povo anda comentando. Por mais que as Academias sejam muito aquém do que se deve fazer acontecer, vemos alguns avanços nas premiações, pequenas, mas vemos. Ainda é preciso avançar mais no que diz respeito a representatividade e a dar vozes a quem pouco se é ouvido, mas que trabalha tanto quanto quem está lá sempre nos holofotes. Atualmente estamos assistindo a um time muito bom de jovens atores em ascensão na estrada hollywoodiana, contudo, ainda está ausente pessoas de outros gêneros e classes. 

As piadas funcionam muito bem neste roteiro assinado por Drew Pearce. Desde incluir a relevância para eventos significativos do cinema, como a Comic Con, ou a reunião de San Diego foram muito bem colocadas. Judy consegue entregar as dificuldades e os maiores desafios de quem está sentado do lado de trás das câmeras em busca da cena perfeita, ou daquela cena que seja o mais realista possível. Enquanto que Colt nos mostra que ser um dublê é algo muito maior e que não ganha o mérito necessário.

A crítica que Colt faz nas telas é satisfatória e precisa ser ouvida: o oscar não se lembra dos dublês! E não lembra mesmo, e isto é um erro. Muitos críticos já anunciam que este futuro está mais próximo, o da Academia criar uma Categoria que avalie o trabalho das equipes de dublês de cada filme e quiçá, também subir nos palcos das premiações. Precisamos avançar para que toda e qualquer categoria de trabalho humano seja considerada, acolhida e lembrada. O Dublê é a pura farofa cinematográfica anunciada e abraçada sem medo de errar. É um filme carismático, bastante família e bom para se divertir. Não há química nenhuma entre Gosling e Blunt, mas, convenhamos que não é o melhor papel da carreira deles, e eles nem precisam ser o centro das atenções neste filme.



Por Dione Afonso  |  Jornalista

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