02 Dec
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Scott já vem amargurado devido ao seu grande fracasso em O Último Duelo (2021)que, mesmo reunindo um time grandioso de atores, o longa não emplacou nas bilheterias e caiu nas garras cruéis de críticos. Agora, lança-se mais uma vez em narrar um épico ao tentar transmitir quem foi Napoleão Bonaparte. Líder político, ambicioso, com perspicácia e audácia estrategistas, marcou a história da França com seus feitos. Aqui, quem dá vida a ele é Joaquin Phoenix ao lado de Vanessa Kirby interpretando a enigmática Josephine. Diante de um personagem histórico de majestosa relevância e de grandes feitos, o desafio é sempre o de decidir por qual narrativa seguir. Aqui, Ridley Scott acerta em cheio ao decidir ir pela loucura como principal personalidade e sua incontrolável sede de poder como estratégia política. 

Vemos na tela um recorte histórico de 25 anos. Não temos Napoleão em sua juventude. O filme começa com sua vitória no Cerco de Toulon, em 1793 e finaliza com sua derrocada em Waterloo, conhecida como a “Fortaleza da Solidão” de Bonaparte em 1815. Parceiro de Scott, Dariusz Wolski é o Diretor de Fotografia também deste trabalho, que ousamos dizer, não ter sido uma escolha muito acertada. Percebemos que a França está muito bem colocada no filme. Uma das mais impecáveis cenas é a da batalha em que os inimigos se afundam no lago congelado, contudo, sentimos que as lentes responsáveis por capturar aquela agonia hipotérmica não cumpriram bem com o seu papel. 


Muito da França e muito de sangue e poder 

A figura de Bonaparte é, até hoje algo que provoca desavenças e contradições para os historiadores. Há aí mais um motivo factual que dificulta na veracidade e autenticidade da obra adaptada. Optar pela loucura e o desejo irrefreável de conquista foi uma escolha acertada, confusa, mas muito bem representativa para o Napoleão que Phoenix se dispôs em colocar na tela. Se tivéssemos, de fato, conhecido pessoalmente quem foi este líder sangrento, talvez teríamos mais credibilidade em mencionar seus grandes feitos ancorados em seus mais profundos desejos. Mas, o que vale ressaltar é que o trabalho de Scott é muito bem arranjado e encaixa-se com a proposta do filme. 

Vemos nos olhos de Napoleão Bonaparte um grande desejo de se firmar como um homem poderoso, sem medo e capaz de grandes feitos. Sem dizer que ele foi assim historicamente, dá-se a entender que Bonaparte era alguém com sentimentos de inferioridade que precisava superar este lugar de pequenez e mostrar, a ferro e fogo, a sangue e bombas, a mortes e conquistas que ele é mais, muito mais do que se aparentava ser. Vemos muito da França, a cultura, a trilha sonora, as personalidades francesas, mas também vemos muito daquele sentimento de submissão, de desgraça e de derrota. Sentimento este que Napoleão passa as duas horas e meia de tela, tentando superar e mostrar pra todo o mundo que a França é muito mais que suas derrotas e inferioridades. 

Portanto, é de suma importância entender este recorte histórico que Scott faz e o seu propósito em contar esta história: no fundo, Scott quer mostrar até onde um homem ambicioso, incontrolável, com grande sede de grandeza e ganância é capaz de amar. Quando, ao morrer, ele menciona a França, sua Josephine e os exércitos, dá-se a entender que poucas coisas Bonaparte foi capaz de amar. E essas coisas se resumem nesta trindade. 


Entre amores e desamores, ascensão e queda 

O filme nos mostra o momento da ascensão e da queda de Napoleão Bonaparte. Mas não é só isso, Ridley Scott quer nos mostrar muito mais. O militar se vê perdido entre seus amores (Josephine e a França) e torna-se um homem violento quando a corrida política o faz tomar uma decisão: é sempre pela França. Entre amores e desamores, Napoleão dribla as tentativas de desertor e ascende ao pódio do Império Francês. O episódio dele ao tomar atitude e se auto coroar (sim, ele mesmo pegou a coroa antes do bispo e a pôs em sua própria cabeça) representa não um escândalo para o país, mas uma virada política para os governos. Ao mesmo tempo que revela poder, ascensão, será este o estopim para seu exílio e queda. 

O roteiro assinado por David Scarpa também é um grande acerto. Há um humor mórbido (mais uma vez, ressaltamos que não afirmamos que Napoleão tinha, de fato, tal personalidade), sarcástico e até de deboche nas relações que envolviam Napoleão com seus soldados em campo de guerra e entre Napoleão e Josephine, a sós. Ao mesmo tempo que, nas jogadas políticas Napoleão era implacável, nunca abaixava a cabeça e sempre tinha uma resposta imediata, quando este voltava para casa, a submissão aos seus sentimentos irracionais de desejo, amor e sexo o consumia e o domava. Nas cenas de sexo Napoleão nunca se despia de seu uniforme, talvez, uma tentativa em tentar mostrar que era ele quem estava sempre no poder... mas... parece que isso não era tão eficaz assim. 

O filme, portanto, mesmo longo e com um ritmo lento, apresenta a grandiosidade das batalhas épicas e a derrocada de Napoleão até seu exílio final. O roteiro é muito bem trabalhado e a atuação de Phoenix garante o espetáculo. Por outro lado, Kirby não foi bem aproveitada, ou, se foi esse o objetivo, ela nos apresentou uma Josephine chata, insuportável e muito burra. Uma atuação que não deu muito certo e não se encaixou no contexto geral da obra. Se vale a pena assistir? Vai depender do seu amor pela França e seu interesse pela história, do contrário, serão duas horas e meio difíceis de serem digeridas.





Por Dione Afonso  |  Jornalista

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