22 Jun
22Jun

Quase 10 anos depois do primeiro filme, a personagem principal Riley chega à adolescência com todos os trejeitos que podemos receber nessa faixa etária: crises de ansiedade, puberdade, transformações físico-corporais, crises nos laços de amizade, ataques de pânico, momentos da rebeldia, enfim... o clássico da Pixar resolve nos presentear com uma mente que pode não ser tão divertida assim. O cineasta Pete Docter, responsável pelo primeiro filme e que em sua filmografia coleciona títulos como Monstros S.A. (2001); Up: Altas Aventuras (2009); e Soul (2020) cede a cadeira da direção para Kelsey Mann em Divertida Mente 2. Dividindo opiniões, há muitos críticos que defendem que a Pixar já se desgastou no gênero das Animações Cinematográficas. Sem querer entrar nesta discussão, é inegável que o trabalho de Mann inovou e devolveu os holofotes de volta para a franquia. 

Contudo, há de reconhecer que o roteiro não consegue se desvencilhar do ato repetitivo que estes longas nos oferecem. Estamos diante de nada mais, nada menos, de um continuar da história. Isso não é ruim, muito pelo contrário, mas nos oferece uma espécie de limitação que somente algo bem extraordinário conseguiria nos tirar da mesmice em apresentar uma Riley adolescente que simplesmente começa a desenvolver novas emoções. Já fomos agraciados com longas-metragens que abordam o tema da puberdade e da transformação do corpo de uma menina para jovem e mulher. Alguns são muito bons, contudo, o novo trabalho de Mann parece ter medo e pouca segurança em abordar sentimentos que navegam sobre o imaginário de uma adolescente menina prestes a entrar em sua fase jovem-adolescente. 


Dublagem brasileira impecável 

Para quem é brasileiro e optou em assistir ao filme dublado em português teve um acréscimo e uma experiência melhor. O time de dubladores é impecável e realizou um trabalho excepcional. Os sentimentos encontraram mais vida, liberdade e cor com as vozes de atores e atrizes brasileiros que se doaram para um trabalho que faz toda a diferença. Ver a Tatá Werneck na voz da ansiedade é uma experiência cinematográfica que somente este filme foi capaz de nos entregar. E tantos outros que fizeram de suas dublagens uma experiência de vida inesquecível. Eli Ferreira deu voz à Tédio; Gaby Milani foi Inveja e Fernando Mendonça fez a Vergonha. 

O surgimento do transtorno de ansiedade que Riley enfrenta pela primeira vez na adolescência é uma das melhores cenas que o filme nos entregou. A Pixar soube reconhecer que tal momento na vida de uma pessoa, sobretudo de um adolescente que precisa lidar com as novas perspectivas, novos desafios e as escolhas que precisamos fazer afeta e muito a nossa existência. Riley enfrenta um medo, um surto, uma angústia, uma mistura de sensações que se torna necessário buscar o equilíbrio e a vontade de tomar novamente as rédeas da situação. 

O que nos desconecta bastante do filme é a sua fórmula descaradamente repetida do primeiro filme. Não nos cabe dizer se isso é bom ou ruim; se é positivo ou negativo. As camadas que se acrescentam nesta nova história não são muito originais, mas fazem bem feito no que é proposto em fazer. Esta continuação nos dá uma importante lição de vida: precisamos aprender a lidar com nossos sentimentos e não deixa-los decidir o rumo do que sonhamos e desejamos ser. Quando a Ansiedade enxota a Alegria para fora do comando e assume o rumo da vida de Riley, um caos se estabelece dentro e fora da mente daquela adolescente. E isso não é muito diferente do que assistimos continuamente no dia a dia. 


A idade da vergonha e do (des) pertencimento 

Quem não reparou que, enquanto no primeiro filme a ilha da família era a maior no subconsciente da Riley e agora ela é a menor? Quem não se tocou que enquanto criança, o ser humano nunca sente vergonha de nada e na adolescência, este sentimento passa a fazer parte das relações? Quem não percebeu que o Tédio ficou totalmente sem lugar quando tiraram dele a sua única segurança? Erroneamente apelidada de “idade da vergonha”, o trabalho do cineasta também foi o de nos ajudar a perceber que nossos sentimentos muito têm a nos dizer, ensinar e nos proporcionar. Não somos uma máquina! Somos seres humanos, de carne, ossos e sentimentos. 

Quando a Riley tenta bloquear suas amigas de infância, na verdade ela está buscando formas de lidar com aquela aparente perda. Todos nós temos medo da mudança, tememos o novo. E, sobretudo, tememos aquela novidade que pode mudar o rumo de nossa vida para sempre. Ao mesmo tempo que a adolescente se encanta com a possibilidade de crescer, progredir e se tornar alguém melhor, ela teme não poder fazer isso gostando das mesmas coisas e se permitindo ouvir e experimentar as mesmas coisas quando criança. Para quem teve a chance de conferir o trabalho de John Krasinski, Amigos Imagináriosconseguiu perceber bem este dado. O trabalho de Krasinski consegue inovar e apresentar com criatividade este dado que sempre permeia e assombra as transformações que sofremos a cada fase da vida.




Por Dione Afonso  |  Jornalista

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