19 Nov
19Nov

Quando Ridley Scott anunciou a sequência de seu clássico dos anos 2000, que, inclusive, rendeu-lhe indicações ao Oscar naquele ano, vencendo na Categoria de Melhor Filme, as expectativas para ir aos cinemas conferir sua nova obra não estavam tão em alta. Dado aos seus últimos – péssimos – trabalhos como Napoleão [2023]; Casa Gucci [2021]; O Último Duelo [2021] e a questionável franquia Alien. Contudo, Scott tem ótimas obras em sua filmografia que sempre merecerão nossa atenção e respeito, sobretudo quando, em sua vasta criatividade consegue unir ficção científica, suspense e narrativa épica numa única obra. Alien [1979]; Blade Runner [1982]; Thelma e Louise [1991] e Gladiador [2000] são alguns de seus maiores sucessos. 

Vinte e quatro anos depois, Gladiador 2 segue num período em que o Império Romano tenta sobreviver a algumas perturbações. Um período politicamente caótico governado pelos irmãos Caracala [Fred Hechinger] e Geta [Joseph Quinn]. Mesmo tentando se sobressair com as conquistas e domínio de terras e povos nas redondezas, o General Marcus Acacius [Pedro Pascal], que atualmente é casado com Lucilla [Connie Nielsen], viúva de Maximus X [Russell Crowe, no primeiro filme], planeja um golpe de Estado afim de devolver Roma a quem é de direito. Outro agravante: o colecionador de escravos Macrinus [Denzel Washington] vê uma oportunidade de conquista e poder quando compra Lucius Maximus [Paul Mescal], filho de Lucilla e Maximus X. 


É o melhor filme do ano? 

Com 2025 já quase batendo à nossa porta, está na hora de fazermos aquele balancete cinematográfico anual. A obra de Scott, de fato, o redime de seus insucessos anteriores. David Scarpa e Peter Craig, que assinam o roteiro, evidenciam a força e a brutalidade da guerra e da masculinidade ferida quando se tira do homem tudo o que ele ama. Nos dois filmes, tanto no protagonismo de Crowe, quanto no de Mescal, este é o primeiro plano da narrativa e não é ruim; muito pelo contrário, é bem feito, bem enquadrado, bem filmado e muito melhor atuado. Paul Mescal nos entrega um soldado de guerra em busca de vingança, justiça e da concretização daquele sonho que todos almejam conquistar: o da Roma livre e aberta para todos. Governada por quem deve ser por direito e não por usurpação. 

Gladiador 2, de fato, começa a aparecer na lista dos melhores do ano. A fotografia de todo o filme é espetacular. John Mathieson fez um ótimo trabalho e conseguiu dar a Lucius a grandeza que o personagem precisava para evidenciar sua presença, força e caráter. As semelhanças entre pai e filho – Lucius e Maximus X – constroem entre os dois filmes uma conexão mágica e excepcional que só um bom cineasta e um bom roteiro conseguem nos oferecer. Em todo o filme há cenas épicas como a do Coliseu cheio de água e tubarões num dos duelos entre barcos. Scott acertou nosso ego de cheio e nos ofereceu uma das coisas mais maravilhosas que o cinema poderia proporcionar. Nada sugere artificialidade, os planos abertos são muito bem dirigidos para as telonas. 

Não estamos diante de uma simples sequência. Aqui não tem Maximus X, mas temos uma nova história. É uma sequência que nos apresenta novos personagens; outros contextos; Roma em uma era diferente e com conflitos e interesses políticos diferentes. Ridley Scott consegue criar uma nova dinâmica para Gladiador II. Se antes, o General Romano perde tudo e vira gladiador; agora, um simples soldado fora dos muros de Roma, é vendido como escravo, vira gladiador e retoma Roma de volta, tirando-a das mãos de inimigos que sugavam do poder e do status românicos. Se no primeiro filme temos um rei pervertido como Commodus [Joaquin Phoenix], agora temos dois irmãos que governam um Estado como se estivessem brincando de bonecas. 


A força dos personagens e o poder de atuação 

Como que um filme com as suas mais de duas horas de duração consegue prender a nossa atenção? No caso de Gladiador II, em específico, o poder está na força dos personagens. Há, em Lucius uma mudança de personalidade durante o segundo ato. E, isso poderia enfraquecer a narrativa se não fosse a entrada triunfal do personagem de Washington como Macrinus, o comerciante de escravos. O ator entrega uma de suas melhores performances de sua carreira. Toda a nossa atenção se desvia de Lucius para Macrinus que é o responsável por transformar aquele homem “sem nome”, “sem fala”, frio, com ódio e raiva num gladiador e protagonista dessa história. Isso é um espetáculo grandioso, é praticamente um trabalho de equipe em que cada artista reconhece seu lugar e a relevância de sua atuação, seja ela com 10 segundos de tela ou de 3 minutos num plano sequência. 

Divertimo-nos com os gêmeos imperadores que nos entregam um final que não estávamos prontos para ele. Quinn exerce a atuação do irmão mais orientado, correto e sábio, enquanto seu irmão é o exagerado, doente, assombrado e que precisa ser controlado. Hechinger é deslumbrante em sua atuação como Caracala. Consegue nos assustar e nos divertir no mesmo gesto. No ato final, a vilania e a perversidade de Macrinus é desbancada com um último duelo, fora dos muros do Coliseu e com toda a Roma escoltada ao redor. É um plano aberto de tirar o fôlego com mais de 10 mil soldados que precisam se decidir a que Roma eles servirão. Lucius faz seu discurso final sem heroísmo, sem grandeza e sem aplausos, mas com verdade, com justiça e com o dever de que conseguiu se libertar, conseguiu libertar Roma, conseguiu a liberdade que tantos sonharam.




Por Dione Afonso   |   Jornalista

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