De Lex Luthor a CEO de Mídia Digital, o ator Jesse Eisenberg, desde 2022 vem se aventurando com a câmera produzindo seus longa-metragens. Na atuação, sabemos que Eisenberg consegue entregar carisma, boas cenas. Sabe navegar entre o cômico e o drama com muita facilidade. Pode fantasiar, se for preciso e até mesmo interpretar personagens icônicos da realidade. Como diretor, sua câmera é hiperativa e tenta, ao máximo, capturar o maior número de ação e movimento possíveis. Vimos isso com When You Finish Saving the World, que foi apresentado no Festival de Cinema de Cannes e agora, em A Verdadeira Dor. Com dois trabalhos em sua filmografia, Eisenberg parece se interessar por personalidades mais da classe média – alta – com certos distúrbios que envolvem alto grau de narcisismo, popularidade reprimida e solidão optativa.
A Verdadeira Dor conquistou duas indicações ao Oscar 2025, incluindo a de Melhor Roteiro Original. Eisenberg atua ao lado de Kieran Culkin. Eles protagonizam a história dos primos David (Eisenberg) e Benji Kaplan (Culkin) que, depois de perderem a avó, decidem embarcar numa viagem até a Polônia em homenagem a ela, revisitando suas origens. David e Benji começam a ter que lidar com antigas tensões e sentimentos e ambos os personagens explodem sentimentos reprimidos, dores internas e sensações de medo e desespero. O roteiro de Eisenberg tenta dar conta de tudo o que os personagens sentem e ele brilha quando percebe que nem tudo o que é sentido, necessariamente precisa ser dito.
Estar ao lado do melhor amigo é sempre um presente. Estar presente é o presente. Não importa o lugar, a situação, a comida, o transporte, o que importa é a companhia, a pessoa, o amigo que está ao lado, junto. David e Benji são dois adultos que seguiram por caminhos completamente diferentes. David, homem casado, com filhos, trabalha todos os dias, o dia todo, vendendo anúncios comerciais na internet. Tem uma vida pacata, sem emoções e, no dizer de Benji, uma vida triste e sem aventuras. Já Benji, parece ser aquele jovem adulto que não se planejou muito para o futuro. Muito conectado à avó, parece ter perdido o rumo depois que ela faleceu. Sem muito dizer de seu personagem no primeiro ato do filme, percebemos que ele é solitário, mas por opção... estar no aeroporto por horas observando todos que ali chegam e passam, parece ser um gesto que indica, ao mesmo tempo, o simples fato de poder observar o diferente, e, o de representar que está sozinho e não tem ninguém.
Mas, Benji tem David e David tem Benji. E um não suporta a ideia de viver sem o outro. O segundo ato do filme é visceral, cheio de gritos, explosões sentimentais. Lágrimas, desabafos... a verdadeira dor se manifesta quando extremos nos atingem. Enquanto David, num momento de fúria provocado pelo próprio primo, desaba num jantar, jogando pra fora tudo o que aperta seu coração... David, depois de passar pelos campos de concentração, onde tantos judeus tiveram suas vidas encerradas, se desmancha num choro doído e que corta a nossa alma profundamente.
Numa virada surpresa, o roteiro, entre esses diálogos, nos revela também outro tema sensível à narrativa: o ato suicida. Quando David revela que Benji tentou contra a própria vida, percebemos o quão verdadeiro, honesto e necessário é esta amizade entre estes dois primos. O filme termina num diálogo que não surte efeito para os personagens, mas que é brilhante para a narrativa. Ambos revelam que sentem falta um do outro, mas que ninguém consegue abrir mão de algo para voltarem a se encontrar com frequência como faziam no passado. A amizade parece sofrer um certo tipo de desleixo e desinteresse de ambas as partes.
Já é de nossa consciência de que fazer chorar é mais universal do que fazer sorrir. Todos nós conseguimos chorar pelo mesmo motivo, pela mesma cena, pelo mesmo filme. Mas, nem todos conseguimos achar graça e rir pelos mesmos motivos. O roteiro de Eisenberg também nos coloca numa viagem de autodescoberta, mesmo que isto não esteja muito claro no pensamento dos personagens. Eles mesmos se percebem que estão se autodescobrindo a cada passo que dão nesta jornada. Mais do que revisitar as origens da avó falecida, eles estão se reconectando novamente. Se reencontrando e celebrando a verdadeira amizade que há muito não celebravam. Até se permitem realizar certas loucuras que fizeram parte do passado, mas que hoje, perderam a inocência em fazê-lo.
Outro ponto relevante entre os personagens é que David parece ter se enrijecido para os sentimentos. O que nos assusta, pois um homem com esposa e filhos, logicamente teria que ser mais afável, amável e sentimental. Mas, ele se tornou um homem mais frio, tímido, completamente retraído e cheio de TOCs. Benji, por outro lado, se mostra um amigo mais palpável, comunicativo, explosivo às vezes, mas sempre muito sorridente e piadista. A Verdadeira Dor é a celebração não da dor, mas de uma amizade que precisa se curar, se permitir doer para encontrar o remédio juntos. É um filme leve e motivacional e que acrescenta positivamente numa carreira que Eisenberg pode continuar investindo.
Por Dione Afonso | Jornalista