Há três anos, em 2022, quanto a primeira temporada de Ruptura foi lançada, logo de primeira a criação de Dan Erickson já nos prendeu a atenção. Focada num misterioso ambiente de trabalho, a série abordou um dos maiores desejos do ser humano: separar literalmente sua vida pessoal da sua vida do trabalho. E assim foi feito! Compreendemos que ruptura é o nome de um procedimento que se faz no cérebro através do implante de um chip em que cada pessoa consegue dividir sua personalidade e sua consciência em duas. E uma não tem contato com a outra. Esse tipo de série é aquela que nos apresenta uma jornada nada convencional e que faz nossas mentes explodirem em teorias. Começou assim com a aclamada Lost em 2004; depois fomos conhecendo outras com o mesmo estilo como The Leftovers [2014]; True Detective [2014]; Dark [2017]; Yellowjackets [2021]; Paradise [2025] e muitos outros nomes que apresentam uma narrativa carregada de suspense e que nem sempre vai te dar todas as respostas.
Assim, chegamos com Ruptura, que tem a mesma jornada, uma série que nos enche de teorias e que não vamos conseguir descobrir tudo o que ela se dispõe a nos apresentar. A segunda temporada retorna com seu elenco principal, os quatro refinadores de Microdados, Mark S. [Adam Scott]; Helly R. [Britt Lower]; Dylan [Zach Cherry] e Irving [John Turturro]. Também temos o retorno de Patricia Arquette como Harmony Cobel, Tramell Tillman como Milchick e de Dichen Lachman como Gemma. Todo este corpo de elenco está diretamente envolvidos com a empresa Lumon, a responsável pelo procedimento de ruptura e que, parece esconder mais mistérios do que o convencional. Sarah Bock e Gwendoline Christie foram dois nomes também adicionados ao elenco.
Para iniciar nossa conversa, é válido mencionar que a série não deixa claro quanto ao período histórico em que ela se passa. Não temos aparelhos celular, os carros são mais antigos, ainda há os telefones com fio e de discagem natural, os computadores são de tubo... Ao mesmo tempo, temos o procedimento científico que é avançado demais para a época. As próprias instalações da Lumon são super desenvolvidas, com tecnologias de ponta. Portanto, a temporalidade neste sentido nos fica confuso. Tudo se confunde mais ainda quando este segundo ano da série decide nos levar para fora da empresa. Enquanto a primeira temporada teve que estabelecer o ambiente interno de seus funcionários, a segunda nos levou para fora. E algumas jornadas merecem a nossa atenção.
Primeiro, vemos Harmony Cobel, depois de ser enxotada da Lumon, decide visitar seu passado e reunir provas e argumentos para recuperar de volta o lugar que lhe pertence por direito. Nesta sua viagem, é a primeira vez que a série nos mostra o mundo externo com mais qualidade. Estradas, lagos congelados, florestas secas pelo inverno, montanhas, galpões, carros, outras pessoas... Tudo muito frio, seco e sem vida. Mas ao mesmo tempo, tudo muito lindo, bem filmado e de uma fotografia espetacular. Cobel vai visitar sua antiga casa, onde vive uma tia e, descobrimos também como que foi o seu passado. Cobel é a responsável por criar o procedimento e nos parece que a Lumon tirou este reconhecimento dela. A personagem de Michael Siberry, o Sr. Eagan ainda é um mistério para nós, mas, pode ser que consigamos mais na terceira temporada.
Outra jornada externa se deu com o personagem de Turturro. Irving, após sua saída da Lumon tentou se reencontrar, se reconectar com uma nova vida. Tudo ao redor de Irving nos dói, e o machuca também. Vemos muita dor, arrependimento, solidão e uma tristeza profunda que não passa. É o nosso melhor personagem e muitos de nós não concordamos com o fim que ele teve. Se é que aquela sua partida naquele trem seja mesmo seu fim. Se for, não o veremos mais. Mas o episódio dá outro show de fotografia e de belas paisagens do lado de fora do prédio da Lumon. A pequena Huang, personagem de Bock também parece ter encontrado seu desfecho. Confuso, mas, pelo menos é o que parece.
Não podemos terminar este texto sem exaltar, com perfeição o trabalho de fotografia desta série. É um espetáculo que se descortina diante de nossos olhos. Muito bem enquadrado, os planos abertos conseguem nos transportar para um horizonte de possibilidades sem fim. Quando a série precisa dar foto a uma cor, um rosto, um olhar, uma ruga, a câmera faz aquele plano fechado e detalhado que também nos sufoca, prende nossa atenção e arranca nossos aplausos e admiração. 90% dos créditos desta série está em sua fotografia. Erickson e Bem Stiller que dirige a maior parte dos episódios também desenvolvem uma narrativa cheia de mistérios e de sentido. Em nosso artigo sobre a primeira temporada demos valor ao lado desiderativo do ser humano de querer viver duas vidas. De fato, o interno não tem conexão com o externo e parece que a Lumon erra feio quando propõe este tipo de relação.
Neste segundo ano, nossas perspectivas mudam de posição, contudo, ainda permanece um fato: os que realizam o procedimento, o fazem para fugir de um trauma, uma dor, um luto, uma situação desfavorável que a vida lhes causou. E, enquanto estão na jornada de trabalho, “protegidos” pelos corredores da Lumon, ali desenvolvem uma personalidade feliz, longe de seus problemas pessoais e sociais e vivem momentos de glória e de reconhecimento. Saindo da Lumon, seus externos só fazem, retornar para suas casas, retomam suas vidas medíocres e mergulham no esquecimento. O clímax final da segunda temporada sugere que no terceiro ano os externos e os internos terão conflitos maiores e que, talvez a Lumon terá que aumentar sua política de reclusão e proibições. Cobel tem algumas cartas a seu favor, resta saber como ela as colocará no jogo.
Por Dione Afonso | Jornalista