14 Sep
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O movimento expressionista teve seu tempo áureo por volta do século XX como uma tendência artística da Europa. Enraizado em solo alemão [1905-1914], o movimento artístico tentava se contrapor ao impressionismo francês. A arte expressionista é marcada pela representação subjetiva da realidade humana, valorização de sentimentos irracionais além de dar ao artista uma particular expressão da realidade. Vemos muito disto em Anita Malfatti, Portinari, entre outros... O cinema de Tim Burton chegou a nós em 1985, quando lançou seu primeiro longa As Grandes Aventuras de Pee-wee. Mas, foi em 1988, quando Beetlejuice – Os Fantasmas Se Divertem chegou a nós, que o público entendeu o verdadeito estilo de Burton. O cineasta não teme pesar sua mão em conceitos e artes fora do comum, utilizando-se de uma corrente já consolidada nas paredes e telas, e, agora, também nas câmeras. 

Beetlejuice, Beetlejuice 2 – Os Fantasmas Ainda Se Divertem recupera esta essência Burtoniana e restaura o seu cinema original. Tal recuperação se dá depois de tantos trabalhos magistrais de Burton como Alice No País Das Maravilhas (2010); O Lar Das Crianças Peculiares (2016 e Dumbo (2019) não terem ganhado tanta notoriedade pelos críticos. A mente de Tim Burton é um arsenal de criatividade, estilo e bom gosto. Era preciso trazer de volta para as telas toda essa inteligência, afim de percebermos que o cinema ainda vive do comum e do prático, sem apelar para o artificial. A sequência dos anos 1980 traz de volta Catherine O’Hara e Winona Ryder em seus papeis Lydia Deetz e Delia Deetz, respectivamente. Lydia, sua mãe e sua filha Astrid Deetz (Jenna Ortega) precisam voltar à casa antiga para superar uma tragédia familiar. Nesse enredo, Beetlejuice (Michael Keaton) consegue escapar e retorna ao mundo dos vivos mais uma vez. 


Três gerações 

Delia, Lydia e Astrid representam três gerações da família Deetz alguns anos depois de terem vivido uma experiência sobrenatural e complicada. Lydia tornou-se uma artista de TV por conta de sua peculiaridade psíquica de ouvir os mortos. Sua relação com a filha Astrid não é a da mais bem-vinda, sobretudo depois que um acidente de carro levou o pai. Astrid também é aquela adolescente que escolheu o lado da ciência e dos fatos, condenando a mãe de ser uma farsa para enriquecer. Delia seguiu carreira com sua arte, na qual conseguiu enriquecer e seguir a vida. Estas três mulheres são as responsáveis em carregar todo o enredo de uma sequência de Beetlejuice, pois, na família Deetz, em três eras distintas, há o suficiente para embalar bons diálogos, estabelecer conflitos e determinar o curso das narrativas. 

Contudo, Burton e a dupla de roteiristas Alfred Gough e Miles Millar não seguiram por este caminho. Aqui entra as outras adições de elenco: Monica Bellucci é um fantasma vingativa que consegue voltar e inicia sua caça à Beetlejuice. Uma perigosa vilã sugadora de almas, encontra na atuação de Bellucci menos palavras e mais ações. Willem Dafoe é o fantasma detetive que, antes de morrer era um ator de sucesso. Na divisão dos fantasmas, Dafoe nos oferece uma atuação cômica que rende boas risadas e bastante carismática. O detetive, nas poucas vezes que apareceu, conseguiu nos conquistar. Arthur Conti é o mentiroso Jeremy, um fantasma “preso” à terra que consegue seduzir Astrid e a coloca num jogo perigoso no além. São personagens que fizeram a diferença nesta sequência que serviram de âncora para que a narrativa pudesse seguir. Não que fosse necessário, mas funcionou. 

É importante ressaltar ainda o retorno de Keaton, que, com o peso de sua idade, consegue entregar um Beetlejuice ainda vivo, ativo, que tem vigor e força. Beetlejuice está tão sem vergonha quanto, cafajeste e mentiroso. Cheio de suas artimanhas e segredos e convicções pessoais, o fantasma traiçoeiro não perdeu a sua essência e continua entregando o suficiente para que a história possa acontecer. A Astrid de Ortega, talvez estivesse um pouco desconectada de todo o contexto, mas isso não tirou seu brilhantismo, e escolhe-la como a salvadora nas cenas finais serviu para dar um impulso à relevância de sua personagem e para pensar como que seria o futuro depois de tudo o que aconteceu. Uma adolescente que chamou a mãe de mentirosa durante todo o tempo, se viu, dentro da mentira que ela contava e que era tudo real e verdadeiro. 


Os Fantasmas Ainda Se Divertem 

Beetlejuice não é qualquer fantasma. Ele é brincalhão, trapaceiro e cheio das suas artimanhas. Logicamente que vê-lo “comandando” uma subdivisão no além fez todo o sentido para a permanência e continuação de sua história. Ver sua ex-mulher livre novamente e com sede de vingança indo atrás de sua alma conferiu ao personagem aquele fiapo de importância que o público teria por ele. É bonito ver como que Ryder vai cedendo seu espaço de tela para Ortega e como que Ortega sabe aproveitar as chances que vão surgindo para ela. Enquanto está no além e se encontra com seu pai, Jenna Ortega entrega um show de atuação e consegue equilibrar sua juventude com a criatividade que Beetlejuice Beetlejuice exige. 

O novo filme de Tim Burton nos mostra que seu cinema sempre esteve vivo e que ele nunca errou. Suas escolhas fazem parte de um ciclo social e artístico que o mundo vai sofrendo com o passar das décadas. Talvez o público queira ver mais uma vez o brincalhão Beetlejuice nas telonas, talvez um coroamento ou conclusão de sua jornada. Claro que o novo filme deixa algumas pontas soltas e perguntas que gostaríamos que fosses respondidas. Mas, caso não sejam, isso não o diminui. Beetlejuice Beetlejuice 2: Os Fantasmas Ainda Se Divertem é divertido e muito criativo. Vale a pena e merece o nosso play.



Por Dione Afonso  |  Jornalista

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